domingo, 7 de abril de 2019

"Oposição quer terceiro turno", por Ruy Fabiano


O governo Bolsonaro pode se queixar de tudo, menos de surpresa. O que lhe ocorre – e a recepção selvagem a Paulo Guedes, na CCJ da Câmara, esta semana, resume a ópera – era previsível.
Ele foi eleito para faxinar o establishment político, um dos mais corruptos e poluídos do planeta. E não se faz isso impunemente.
A reação se manifesta em todos os poderes, instituições e áreas de influência: mídia, oligarquia cultural, OAB, CNBB, entre outros.
Há uma ameaça latente a todas as zonas de conforto da sociedade, habituadas a conviver com a corrupção, desde que em dosagens que não matassem o paciente – isto é, o país.
O PT levou-o à UTI, o que desagradou a alguns. Mas o combate empreendido pela Lava Jato, a princípio saudado, passou a incomodar a mais gente ainda, sobretudo quando excedeu o âmbito do PT e chegou a setores que antes o criticavam, como PSDB e outros.
O ministro Gilmar Mendes é o rosto mais visível dessa mutação. Antes, classificava o governo petista de “cleptocracia”; depois, achou interessante que os petistas se tornassem habitués de seu gabinete e já o chamassem de “pátio dos milagres”. O temor comum os uniu.
Bolsonaro capitalizou eleitoralmente o despertar da maioria silenciosa, que começou a sair de sua retração já nas manifestações de 2013. O crescimento da Lava Jato levou ao impeachment e à eleição do candidato que personalizava a ruptura. Os derrotados estão unidos na tarefa comum de providenciar um terceiro turno.
José Dirceu, condenado em segunda instância a 30 anos de prisão – e não obstante solto e sem tornozeleira -, disse, em uma de suas entrevistas, que o projeto liberal de Paulo Guedes tem tudo para dar certo, o que tornaria o período Bolsonaro longo e próspero.
É preciso, portanto, dentro de sua visão estratégica, impedir que esse projeto seja posto em prática – e mãos à obra.
O ato primeiro, em pleno curso, é inviabilizar a reforma da Previdência, o que imporá impacto negativo ao mercado, com o respectivo agravamento dos índices sociais negativos (desemprego, violência, descrédito do governo etc.). A rejeição ao pacote anticrime de Sérgio Moro faz parte dessa estratégia, o que une establishment e facções criminosas, ambos movidos pelo mesmo interesse.
Basta ver a ameaça que o relator do pacote de Moro, senador Marcos do Val, recebeu por parte de criminosos contrariados com o seu conteúdo. Teve sua família ameaçada e a ameaça descrita em detalhes sórdidos e irreproduzíveis. A oposição radical (PT, PSol, PcdoB etc.) não chancela a forma, mas subscreve o conteúdo.
O que até aqui o governo concebeu como estratégia de reação é a ocupação das mídias sociais, de modo a falar direto à população. É um começo. Mas as reformas não serão votadas pela internet. Algo mais precisa ser feito para que o Congresso se sinta pressionado.
Se não haverá troca-troca – não ao menos na escala capaz de estabelecer maiorias seguras -, a pressão terá de vir das ruas. Ulysses Guimarães, que conhecia bem a Casa, dizia que só um poder reinava soberano sobre o Congresso: o das ruas.
A história recente dá-lhe razão.
Ruy Fabiano é jornalista 

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