sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

ENTREVISTA COM JORDAN B. PETERSON, PESQUISADOR E TERAPEUTA CANADENSE

Jordan B. Peterson (Imagem: Marta Iwanek)
Jordan B. Peterson é um experiente psicólogo, pesquisador e terapeuta canadense. Nesta entrevista, conta como veio a se rebelar contra o que vê como autoritarismo politicamente correto de ativistas de sua universidade (U. de Toronto) e de seu país, e contra um projeto de lei que torna obrigatório o uso de pronomes inventados para pessoas “transexuais não-binárias”.
Jordan B. Peterson (Imagem: Marta Iwanek)
(Imagem: Marta Iwanek)
Você pode nos dar uma breve contextualização da sua carreira acadêmica e dos seus interesses?
Nos dois primeiros anos da minha graduação estudei ciência política e literatura inglesa. Eu era muito interessado em política, mas o que eu estava aprendendo em economia e ciência política simplesmente não estava certo. Havia ênfase demais colocada na ideia de que os interesses econômicos eram o motivador primário para seres humanos, e isso não era nem um pouco óbvio para mim. Eu estava gastando muito tempo pensando na Guerra Fria, e a Guerra Fria não foi primariamente um problema econômico. Então comecei a cursar aulas de psicologia, e estava interessado em psicologia clínica. Fiz meu PhD orientado pelo Dr. Robert Pihl, e trabalhei com abuso de drogas, alcoolismo e agressão – havia uma ênfase biológica pesada. Fiz meu pós-doutorado com o Dr. Pihl e Maurice Dongier. Então lecionei em Harvard por seis anos, e estou na Universidade de Toronto desde então.
Meu interesse primário sempre foi a psicologia da crença. Parcialmente crença religiosa, e ideologia como uma subcategoria da crença religiosa. Uma das proposições de Jung era que qualquer coisa que uma pessoa dá o mais alto valor é seu deus. Se as pessoas acham que são ateias, isso significa que elas estão inconscientes de seus deuses. Em um sistema religioso sofisticado, há uma polaridade positiva e negativa. Ideologias simplificam essa polaridade e, fazendo isso, demonizam e simplificam demasiadamente. Fiquei interessado em ideologia, em grande parte, porque fiquei interessado no que houve na Alemanha nazista, na União Soviética, e na Revolução Cultural na China, e ocorrências equivalentes em outras partes do mundo. Eu me concentrei mais na Alemanha nazista e na União Soviética. Eu estava particularmente interessado no que levou pessoas a cometerem atrocidades a serviço de suas crenças. O lema do Museu do Holocausto em Washington é “não devemos esquecer nunca”. Aprendi que você não pode se recordar do que você não entende. Pessoas não entendem o Holocausto, e elas não entendem o que aconteceu na Rússia. Tenho esse curso chamado “Maps of Meaning” [NT: Mapas de Sentido], que é baseado em um livro que escrevi com o mesmo nome, e ele descreve essas ideias. Uma das coisas de que estou tentando convencer meus alunos é que se eles tivessem vivido na Alemanha na década de 1930, eles teriam sido nazistas. Todo mundo pensa “eu não”, e isso não está correto. Foram em grande parte pessoas comuns que cometeram as atrocidades que caracterizaram a Alemanha nazista e a União Soviética.
Parte da razão pela qual eu me vi envolvido com essa controvérsia [sobre identidade de gênero] foi devido ao que eu sei sobre como as coisas deram errado na União Soviética. Muitas das doutrinas que fundamentam a legislação à qual eu me oponho compartilham estruturas similares com as ideias marxistas que dirigiram o comunismo soviético. A coisa à qual eu mais me oponho era a insistência para que as pessoas usassem essas palavras inventadas como ‘xe’ e ‘xer’ [NT: pronomes ditos neutros, equivalentes a “elx”/”delx” em português] que são construções de autoritários. Não existe a menor esperança de que eu use a linguagem deles, porque eu sei a onde isso leva.
Há vários casos onde a expressão livre tem sido atacada, por que você escolheu esse assunto particular?
Esse é um discurso muito coercitivo. A Suprema Corte nos Estados Unidos considerou que discurso coercitivo é inaceitável por duas razões. Uma é para proteger os direitos de quem fala, outro é para proteger os direitos do ouvinte. O ouvinte tem o direito de ser informado e instruído sem ser indevidamente influenciado por fontes ocultas. Se seu discurso é coercitivo, não é você quem está falando, é uma outra entidade que está compelindo seu discurso. Então eu atualmente acho que o Projeto de Lei C-16 é inconstitucional. Estou usando um caso legal americano, mas os princípios se aplicam. Isso só não chegou à nossa Suprema Corte ainda.
Para mim isso se tornou um problema porque não existe a menor chance de que eu vá usar linguagem radical, autoritária. Eu estudei isso psicologicamente, e sei o que isso faz.
Eu também fui profundamente influenciado pelo livro de [Aleksandr] Solzhenitsyn Arquipélago Gulag. As pessoas dizem que o marxismo real nunca foi tentado – não na União Soviética, nem na China, em Camboja, na Coreia, aquilo não era o marxismo real. Eu acho esse argumento especioso, chocante, ignorante, e talvez também malévolo ao mesmo tempo. Especioso porque Solzhenitsyn demonstrou sem uma sombra de dúvidas que os horrores [do sistema soviético] eram uma consequência lógica das doutrinas embrenhadas no pensamento marxista. Eu acho que Dostoyevsky viu o que estava a caminho e Nietzsche escreveu sobre isso extensivamente na década de 1880, expondo as proposições que são encapsuladas na doutrina marxista, e alertando que milhões de pessoas iriam morrer no século XX por causa dela.
Você pintou um quadro bem sombrio para o futuro.
Há coisas sombrias acontecendo. Para começar, o Projeto de Lei C-16 codifica construtivismo social no tecido da lei. O construtivismo social é a doutrina de que todos os papeis humanos são socialmente construídos. Eles são desvencilhados da biologia subjacente e da realidade objetiva subjacente. Então o projeto C-16 contém um ataque à biologia e um ataque implícito à ideia da realidade objetiva. Isso também é flagrante nas políticas da Comissão dos Direitos Humanos de Ontário e na Declaração dos Direitos Humanos de Ontário.Ele diz que a identidade é puramente subjetiva. Então uma pessoa pode ser homem em um dia e mulher no próximo, ou homem em uma hora e mulher na próxima.
Jordan B. Peterson (Imagem: Marta Iwanek)
(Imagem: Marta Iwanek)
Como você vê o futuro do discurso público nesse país se nós não revertermos o curso em coisas como o C-16?
Eu não tenho ideia. Acho que estamos num tempo de caos e nada pode acontecer em um tempo de caos. Eu não sei o que vai acontecer na universidade na próxima semana. Tem um debate no sábado às 9:30 da manhã. Ele será exibido ao vivo no meu canal do YouTube. Eu não tenho ideia de quais serão as consequências do debate, não tenho ideia se estarei lecionando em janeiro. A universidade me disse que cada vez que eu insistir que não irei usar aqueles pronomes [de gênero neutro], a probabilidade de que estarei lecionando em janeiro diminui.
Você acredita que você ou outros poderiam ser presos por se recusarem a obedecer àquelas leis?
Não há dúvida sobre isso. Os tribunais de direitos humanos ganharam o direito de manter pessoas em custódia. Bem, você será mantido em custódia se não pagar a multa. Meus oponentes dizem ‘você está apenas fomentando o medo. Nós não temos de verdade tanto poder assim’. Então por que mudar o código criminal? Por que colocar os corretivos de discurso de ódio lá? A palavra final na lei é o encarceramento. Não há dúvida sobre isso. Quando eu fiz o vídeo em 27 de setembro, disse ‘provavelmente fazer esse vídeo por si é ilegal’. Não só isso, a universidade é tão responsável quanto eu por fazê-lo, porque isso está no código dos direitos humanos. A universidade leu as malditas políticas e seus advogados as escrutinaram, e concluíram exatamente o que eu concluí. É por isso que eles me enviaram duas cartas de aviso. Eles estão no cabide para qualquer coisa que seus empregados disserem, se ou não as consequências do que eles disserem forem intencionais ou não, independente se houve ou não uma reclamação.
Isso inclui coisas que meus empregados dizem em seu tempo privado?
Isso inclui tudo que eles dizem. Não importa se pessoas reclamam ou não. Mesmo se ninguém reclamar, ou mesmo se o efeito não for intencional. A outra coisa que está inclusa nessa lei e nas políticas relacionadas – e isso também é cada vez mais o caso em tribunais de assédio sexual em campi universitários nos quais o governo da [Premiê de Ontário Kathleen] Wynne está fazendo pressão como louco – eles mudaram dois princípios legais. Não é ‘inocente até que se prove culpado’, é ‘preponderância de evidência,’ e não é intenção, é resultado. Essas transformações são tão amplas, é quase inimaginável.
Você está sugerindo que eles alteraram a regra da lei como nós tradicionalmente a conhecemos?
Eles alteraram. Eles dizem ‘o que você diz machuca meus sentimentos’ – e isso é parte do assalto sobre o mundo objetivo – sua intenção é irrelevante. Minha resposta subjetiva é o fator determinante. A ideia de que eles ousariam implodir a doutrina da intenção é inacreditável.
Você está surpreso que quase metade do cáucus do Partido Conservador do Canadá votou a favor do C-16?
Não só isso, não há uma convenção de liderança acontecendo agora? Algum dos candidatos comentou qualquer coisa sobre isso? Não. Por quê? Porque eles estão com medo. Eu acho que o fato de que ninguém comentou sobre isso é uma indicação de como até para conservadores, especialmente no Canadá, a demanda por ortodoxia foi tão longe que mesmo conservadores estão com medo de serem conservadores. Essas coisas não são fáceis de entender. Você pode perguntar, ‘por que você não pode simplesmente perguntar às pessoas do que elas querem ser chamadas?’ Bem, quando alguém questiona seu uso de pronomes, isso coloca você no holofote. Você não sabe por que usa os pronomes que usa. Você os usa porque todos os outros os usam – isso é uma convenção social. Então outra pessoa diz ‘é um sinal de respeito usar um pronome, e é um sinal de respeito usar o pronome de escolha de alguém.’ Esses são assaltos filosóficos de ampla escala. Se você não está preparado para eles, tudo que você pode fazer é ficar desnorteado, e seu padrão vai ser ‘bem, talvez nós devêssemos ser legais’.
Então talvez alguns deles votaram a favor porque eles não entendem os problemas filosóficos e apenas não quiseram ofender ninguém?
É por isso que eu estou tentando separar esses argumentos. Primeiro, “ele” e “ela” não são sinais de respeito. Eles são os termos mais casuais possíveis. Se eu me refiro a alguém como “ele” ou se eu me refiro a alguém como “ela”, isso não é um sinal de respeito, é só categorização do tipo mais simples e óbvio. Não há nada sobre isso que seja individual, ou característico de respeito. Segundo, você não tem o direito de exigir de mim que eu fale qualquer coisa com relação a você que seja respeitoso. O melhor que você pode esperar de mim é neutralidade cética e confiança corajosa. É isso. Isso é o que você consegue de mim.
Você poderia definir esses dois termos?
Neutralidade cética é ‘você é um balde de cobras, assim como eu. Entretanto, se você estiver disposto a manter sua palavra, e se eu estiver disposto a manter minha palavra, então nós somos capazes de nos envolver em interações mutualmente benéficas, logo é isso que nós vamos fazer’. A razão pela qual eu disse confiança corajosa é para distingui-la de inocência. Pessoas inocentes pensam que todo mundo é bom. Isso é falso, todo mundo não é bom. Mas agir de uma forma que seja hostil e cética e antissocial é completamente contraproducente. Então o que você faz se você é uma pessoa madura é você diz ‘bem, beleza, você tem um lado sombrio, eu também. Isso não quer dizer que nós não podemos nos envolver em interações produtivas’. Nós fazemos isso mantendo nossas malditas palavras. A honestidade nos simplifica ao ponto onde nós podemos nos envolver em interações mutuamente benéficas. Mas você certamente não consegue meu respeito exigindo-o. Você não tem qualquer direito de me pedir para marcá-lo como especial de qualquer maneira.
Então nós não deveríamos chamar alguém de ‘sua majestade’ só porque eles pediram isso?
Bem, esse é outro problema que está se escondendo sob o argumento da subjetividade, uma vez que você divorcia a identidade de uma base objetiva. Essas pessoas [defensoras de múltiplas identidades de gênero e leis para protegê-las] afirmam que identidade é uma construção social, mas mesmo que essa seja sua afirmação filosófica fundamental, e que eles a tenham inserido na lei, eles não agem de acordo com aqueles princípios. Ao invés disso, eles vão direto à subjetividade. Eles dizem que sua identidade nada mais é do que seu sentimento subjetivo daquilo que você é. Bem, isso também é uma ideia exageradamente empobrecida do que é que constitui identidade. É como a alegação de uma criança egocêntrica de dois anos, e eu quero dizer isso tecnicamente. Sua identidade não é só como você sente sobre você mesmo. É também como você pensa sobre você mesmo, é o que você sabe sobre você mesmo, é seu julgamento informado sobre você mesmo. Ela é negociada com outras pessoas mesmo se você for vagamente civilizado porque de outra forma ninguém lhe suporta. Se sua identidade não for um híbrido daquilo que você é e daquilo que as outras pessoas esperam, então você é como a criança no parque com quem ninguém pode brincar.
Além do mais, sua identidade é um veículo prático que você usa para manobrar a você mesmo durante a vida. Em sua identidade real, você é um advogado, você é um médico, você é uma mãe, você é um pai, você tem um papel que tem valor para você e outros. Nada disso é subjetivamente definido. Então isso é completamente absurdo, e filosoficamente primitivo, e psicologicamente errado. Ainda assim, está inserido na lei. Eu acho que a lei faz das discussões de biologia e gênero ilegais. Acho que nós tivemos um gostinho disso na entrevista da TVO Agenda que eu tive onde [o professor de estudos transgêneros da U de T] Nicholas Mack disse ‘bem, o consenso científico das últimas quatro décadas é que não há diferença biológica entre homens e mulheres’. Isso é uma proposição absurda. Há diferenças entre os sexos em todos os níveis de análise. Há escalas de masculinidade/feminidade que foram derivadas; elas são basicamente derivações secundárias de descritores de personalidade. Há diferenças enormes de personalidade entre homens e mulheres. Há literatura explorando diferenças entre homens e mulheres em personalidade em muitas, muitas sociedades no mundo todo. Eu acho que a maior publicação examinou 55 sociedades diferentes. E eles ranqueiam as sociedades por igualdade sociológica e política. A hipótese era que se você equaliza o ambiente entre homens e mulheres, você erradica as diferenças entre eles. Em outras palavras, se você trata meninos e meninas igual, as diferenças entre eles desaparecerão. Mas não é isso que os estudos mostraram. Na realidade, elas se tornam maiores. Aqueles são estudos de dezenas de milhares de pessoas. A teoria do construtivismo social foi testada. Ela falhou. A identidade de gênero é muito determinada biologicamente.
Você vê algum paralelo entre esse assunto e outras das causas da ‘justiça social’ que têm surgido nos últimos poucos anos, como Black Lives Matter [Vidas Negras Importam] ou IdleNoMore [OciosoNãoMais]?
É tudo parte e parcela da mesma coisa. Há uma guerra acontecendo no coração da nossa cultura. Muitas pessoas têm falado sobre politicamente correto, e o fato do quanto isso é pernicioso. Frequentemente, isso apenas desaparece no éter. Eu acho que o que eu fiz foi diferente porque havia algo que eu disse que não faria. Isso pegou o geral e o tornou específico.
No cristianismo, há a ideia do Cristo geral, que é a “Palavra” que Deus usou para transformar o caos em ordem. Por outro lado há o Cristo específico, o carpinteiro no Oriente Médio 2000 anos atrás. Então há essa noção estranha no cristianismo entre esse princípio geral, que é o logos aproximadamente falando; o logos é a coisa que media entre a ordem e o caos e é princípio bastante abstrato; e o ser humano específico que teve uma identidade específica ligada a um tempo e local específico, fazendo o indivíduo arquétipo, e isso faz uma história inacreditavelmente atraente. O arquétipo é muito abstrato. É como falar ‘os caras bons ganharam’ – não há história ali. Eu acho que o que eu fiz foi tornar o geral concreto e específico, e tracei uma linha. Agora o preço que você paga por traçar uma linha – especialmente com o material politicamente correto – é que você vai ser difamado como um fanático. As pessoas da justiça social estão sempre do lado da compaixão e dos ‘direitos das vítimas’, então objetar a qualquer coisa que eles façam lhe torna instantaneamente um perpetrador. Não há lugar onde você possa permanecer sem ser vilificado, e é por isso que isso continua rastejando adiante.
Jordan B. Peterson (Imagem: Marta Iwanek)
(Imagem: Marta Iwanek)
Esse não é o resultado lógico da aplicação tática de Saul Alinsky?
Exatamente certo. A coisa é que se você substitui compaixão por ressentimento, então você entende a esquerda autoritária. Eles não têm compaixão, não há compaixão ali. Não há compaixão alguma. Há ressentimento, fundamentalmente.
Em um editorial opinativo do National Post você escreveu que ‘palavras como zhe/zher [NT: equivalentes a elx/delx] são as vanguardas de uma ideologia de esquerda radical que é assustadoramente similar ao marxismo’. Você pode elaborar?
Identidade atribuída é opressão. Identidade atribuída é a identidade que é atribuída para você pela estrutura de poder – o patriarcado. A única razão pela qual o patriarcado lhe designa um status é para lhe oprimir. E logo a linguagem que lhe liberta do status é linguagem revolucionária. Então, como um exemplo de linguagem revolucionária, nós vamos explodir as categorias de identidade de gênero, porque o conceito de mulher é opressivo. A filosofia antipatriarcado é predicada na ideia de que todas as estruturas sociais são opressivas, e não muito mais que isso. Então atacar a estrutura é questionar seus esquemas categóricos em todo nível possível de análise. E o nível mais fundamental que os radicais antipatriarcado elencaram é gênero. Ele é uma peça de identidade que crianças geralmente assimilam por volta dos dois anos – ele é bastante fundamental. Você poderia argumentar que não há nada mais fundamental. Entretanto, eu não sei de nada que seja mais fundamental, mais básico, e que teria sido considerado como mais inquestionável, mesmo há cinco anos atrás.
Você acredita que a sociedade deveria traçar uma linha no que se refere a limitações para discurso de ódio?
Não. As leis sobre discurso de ódio estão erradas. A questão – não uma questão, mas A questão – é ‘quem define o que é ódio?’ Isso não é o mesmo que dizer que não existe discurso de ódio – claramente existe. Leis contra discurso de ódio reprimem, e eu quero dizer no sentido psicoanalítico. Elas fazem [o discurso de ódio] clandestino. Isso não é uma boa ideia, porque as coisas ficam feias quando você as transforma em clandestinas. Elas não desaparecem, apenas apodrecem, e não são sujeitas à correção. Eu fiz esses vídeos, e eles têm sido sujeitos a uma quantidade tremenda de correção nas últimas seis semanas. Eu não quero dizer apenas por parte da resposta do meu público, mas também parcialmente da resposta da universidade, parcialmente de um grupo de amigos que têm estado revisando meus vídeos e os criticando até a morte. É por isso que a liberdade de expressão é tão importante. Você pode se esforçar para formular algum argumento, mas quando você o lança para o público, há uma tentativa coletiva de modificá-lo e melhorá-lo. Então, sobre o assunto discordo de ódio – digamos que alguém seja um negacionista do Holocausto, porque essa é a rotina padrão – nós queremos essas pessoas lá fora, em público, de forma que você possa lhes dizer que elas são historicamente ignorantes, e porque suas visões são infundadas e perigosas. Se você as torna clandestinas, não é como se elas parassem de conversar umas com as outras, elas apenas não conversam com qualquer outro que discorde delas. Essa é uma ideia muito ruim e é isso que está acontecendo nos Estados Unidos agora. Metade do país não conversa com a outra metade. Você sabe do que você chama pessoas com as quais não fala? Inimigos.
Se você tem inimigos, você tem guerra.
Se você para de falar com pessoas, ou você se submete a elas, ou vai à guerra com elas. Essas são suas opções e não são boas opções. É melhor ter uma conversa. Se você coloca restrições na expressão, então você não pode de fato falar sobre as coisas difíceis sobre as quais se precisa falar. Eu tenho aproximadamente 20000 horas de prática clínica e tudo que eu faço por 20 horas semanais é conversar com pessoas sobre coisas difíceis – as piores coisas que estão acontecendo em suas vidas. Essas são sempre conversas difíceis. As conversas que são mais curativas são simultaneamente as que são mais difíceis e mais perigosas. Muitas pessoas normais não terão essas conversas. É por isso que muitos casamentos se dissolvem. As pessoas não gostam de ter essas conversas. Parte disso também é devido – digamos que você tenha tido uma pequena discussão com sua esposa, e você sabe que tem algo mais ali do que a coisa pequena que lhe está incomodando, e você pergunta ‘sobre o que é que REALMENTE você está chateada?’ Tente voltar atrás. Você pode descobrir que ela está chateada com algo que o seu avô fez à sua avó duas gerações atrás que ainda não foi resolvido na sua família, e esse é o elemento determinante de sua atitude no momento presente. Se você desembalar isso, entretanto, então você não precisa vivê-lo de novo e de novo.
Também há essa ideia de que você não deveria dizer coisas que machucam os sentimentos das pessoas – essa é a filosofia da esquerda compassiva. Isso é tão infantil que está além da compreensão. O que disse Nietzsche: ‘você pode julgar o espírito de um homem pela quantidade de verdade que ele pode tolerar’. Eu também falo isso aos meus alunos, você pode dizer quando está recebendo educação porque você está horrorizado. Então, se for agradável e seguro, é como se você não estivesse aprendendo nada. As pessoas aprendem as coisas do jeito difícil.
O que acontece quando aquela verdade de fato contribui para a violência contra grupos?
Você escolhe seu veneno, e a liberdade de expressão é o veneno certo. Há grupos que advogam pelo ódio, mas esse não é o problema. O problema é se reprimi-los faz as coisas melhores ou piores. Eu diria que [lhes reprimir] apenas as faz piores. Existem muitas horas em que você não tem uma boa opção. As pessoas acham que se não deixarmos eles falarem, isso vai sumir. Não funciona assim de forma nenhuma. Na verdade, se eles são paranoicos, você apenas justifica sua paranoia. Por fazer deles clandestinos, você não os enfraquece. Você apenas lhes fornece algo atraente contra o que lutar. Você os transforma em herois aos seus próprios olhos.
Você pode comentar sobre a resposta específica da Universidade de Toronto, a carta que você recebeu do reitor da Faculdade de Artes, David Cameron?
Eles conversaram com seus advogados, e eles estão fazendo exatamente o que pessoas de RH sempre fazem. Se você quer se livrar de alguém, você lhe escreve uma carta. Fale para eles o que estão fazendo errado, fale para eles pararem, e fale gentilmente. Então você escreve uma segunda carta, e lhes diz as mesmas coisas, só que não tão gentilmente. Então você lhes dá uma terceira carta, e depois de lhes dar uma terceira carta, se eles não acatarem, então você pode fazer o que quiser, você deixou sua trilha de papeis. Os advogados checaram as políticas no website da OHRC [NT: Ontario Human Rights Commission, Comissão de Direitos Humanos de Ontário], e concluíram que minha interpretação da lei está absolutamente correta. É pior que isso, entretanto. É tipo ‘tudo bem, isso é contra a lei, supõe-se que a universidade deve seguir a lei, e eu não estou fazendo isso, pelo menos em princípio.’ Então eles têm uma obrigação legal e ética de fazer o que fizeram, mas eles fizeram de uma forma traiçoeira. Na primeira carta, eles me citaram errado. Então eu lhes disse ‘vocês deveriam pegar essa carta de volta e reescrevê-la porque ela não está precisa, e se vocês querem me dar uma carta de aviso, é do seu melhor interesse fazê-lo certo.’ A segunda carta foi ainda pior. Ela dizia que eu contribuí para esse clima de medo e perigo no campus, o que eu pensei ser uma afirmação especiosa e infundada pra início de conversa, mas quando eles mencionaram que tinham recebido muitas cartas de grupos no campus da universidade, eles não mencionaram as 500 cartas que receberam de pessoas me apoiando, sobre as quais eu sei porque fui copiado nelas. Eles não mencionaram a petição com 10000 assinaturas, que eu também recebi. Essa é a mentira. Eles não precisavam omitir isso. Eles podiam ter dito ‘nós entendemos que há uma variedade de opiniões sobre isso, e você tem apoio público substancial. Mas a verdade é que, até onde podemos dizer, isso é ilegal, e é nossa obrigação lhe dizer que você deve se adequar às políticas da universidade e à lei.’ Eles podiam ter feito isso, mas não fizeram.
Então, quando nós começamos a conversar sobre o debate depois da segunda carta, eu fui falar com David Cameron. Eu achei que já que esse é um assunto de grande interesse público aqui, talvez nós devêssemos ter um debate sobre isso. Isso é o que uma universidade faria, se fosse um lugar civilizado, então foi isso que eu recomendei ao Cameron. Ele levou o assunto para a administração da universidade, e eles concordaram. Mas eles me colocaram uma restrição: no debate, não tenho permissão para repetir a declaração de que não vou usar esses pronomes preferidos. É um pouco absurdo que nós vamos continuar com um debate sobre liberdade de expressão, e eu não posso repetir a afirmação central que iniciou o debate. Então eu lhes escrevi e disse ‘olha, vocês estão fazendo isso errado. Ao invés de me dizer “olha, você não pode dizer isso”, o que vocês DEVERIAM estar fazendo é dizendo “você pode estar errado, mas você dever ter permissão para dizê-lo, e nós vamos apoiá-lo por todo o caminho até a Suprema Corte. Nós usaremos nossos recursos legais e lhes colocaremos à sua disposição, e nós vamos combatê-los através dos tribunais.” Cameron disse categoricamente que eles não iriam fazer aquilo. Eles tiveram que escolher entre justiça social e liberdade de expressão. Eles escolheram justiça social – o que é equidade, ou igualdade de resultado – porque é isso que eles estão ensinando. Eu decidi que iria adiante com o debate de qualquer maneira porque, considerando todas as coisas, você nem sempre tem uma boa opção. Eu decidi escolher entre o pior de dois males e prosseguir com o debate.
Então, só pra clarificar suas ideias sobre o projeto de lei C-16. Você acha que seu vídeo do YouTube definitivamente o viola?
A universidade pensa que sim. Eu pensei que sim. Eu li as malditas políticas. Eu chequei as políticas no website da Ontario Human Rights porque eu acho que aquelas são as pessoas que estão por trás de tudo isso. A escrita naquele website é pavorosa de uma perspectiva técnica – ela é incoerente. Eles são a pequena confraria semiletrada, ignorante filosófica, malévola que está por trás disso. Você esperaria mais do que aquilo de quase-judiciários.
O que você espera alcançar com tudo isso?
Espero que eu possa continuar a educar pessoas, tanto na universidade quanto, se não na universidade, então no YouTube. Pela primeira vez na história humana, a palavra falada tem o mesmo alcance e longevidade que a palavra escrita. Não só isso, o tempo entre sua enunciação e sua publicação é zero. Há três meses, tive alguns assistentes de pesquisa escrevendo as transcrições de minhas palestras para que pessoas pudessem assistir minhas palestras com legendas porque é mais fácil para as pessoas seguirem, e eu estava checando meu crescimento em termos de assinantes, e meio que brincando pensei que logo poderia ter mais assinantes no meu canal de YouTube que a U de T tem de alunos. Eu não sei qual a significância disso. Pode ser que a universidade já esteja morrendo. Isso não me surpreenderia. Quero dizer, eu acho que grandes partes da universidade estão irrevogavelmente corruptas: sociologia, perdida; antropologia, perdida; história, grandes partes dela estão perdidas, os clássicos, literatura, trabalho social, ciência política em muitos lugares, e isso não cobre estudos femininos, estudos étnicos. Eles provavelmente começaram perdidos, e as coisas ficaram muito piores. Eu acredito que agora, com a exceção do ramo das ciências, tecnologia, engenharia e matemática (STEM [NT: sigla em inglês]), que universidades fazem mais mal do que bem. Acho que elas produzem servos nos Estados Unidos porque as taxas de ensino aumentaram tanto e você não pode declarar falência sobre seus empréstimos estudantis. Nós estamos ensinando mentiras a estudantes universitários, e passando a mão em sua cabeça, e eu vejo isso como contraproducente.
Há inclusive um programa antipsicológico no OISE [Ontario Institute for Studies in Education, Instituto de Ontário para Estudos em Educação]. Ele começou quando eles se livraram de [Ken] Zucker, e você não para em uma pessoa. Zucker era um psicólogo mais que credível. Ele mantinha um programa muito bom para pessoas que tinham disforia de gênero, e ele era conservador. A atitude de Zucker era que se você tivesse um filho que está reclamando de seu gênero, você os acompanha, e vê o que acontece, e você deriva suas conclusões de sua pesquisa. Oitenta por cento deles se declaram homossexuais, noventa por cento se resolvem com sua identidade biológica quando adultos. Sua conclusão lógica é para manter a maldita faca cirúrgica embainhada, e não trazer os hormônios à cena tão cedo. Bem, tudo isso acabou – é ilegal agora para médicos questionar a decisão de uma criança de três anos de que ele é ela. E se os pais quiserem começar a transformação biológica, é ilegal para os médicos rejeitar isso.
Você viu que Lauren Southern conseguiu identidade de homem do governo de Ontário? Isso lhe mostra o que a lei fez com os médicos. Aquele médico não pôde questioná-la porque isso é ilegal. Então agora Lauren Southern tem identificação governamental como um homem. Ela foi ao quiosque do Serviço de Ontário de salto alto e maquiagem. Ela não esperava conseguir o maldito documento de identificação. Isso também significa que o governo está tão emaranhado nessa bagunça que eles vão de fato sacrificar sua própria identificação. Pense sobre isso – pense sobre o que vai acontecer com nossa sociedade se a identificação das pessoas se tornar instável.
Você disse na sua entrevista com Gad Saad que liberdade de expressão é – “O direito e talvez a obrigação de conduzir discursos que são direcionados à solução de problemas sérios.” O que acontece quando o próprio discurso se transforma em arma?
Erros se acumulam, e o caos toma conta. Eu estudei mitologia por um longo período. A história da enchente significa que se você deturpa as coisas suficientemente, tudo desmorona. Se você interfere com o mecanismo pelo qual as pessoas formulam problemas, os resolvem, e negociam sua implementação, então problemas acumulam e se multiplicam. É isso que é uma hidra – corte fora uma cabeça, sete crescem novamente. Essas coisas podem se multiplicar até sair do controle muito mais rápido do que as pessoas imaginam.
Jordan B. Peterson (Imagem: Marta Iwanek)
(Imagem: Marta Iwanek)
Isso é parte do que explica os resultados da eleição dos Estados Unidos?
Os democratas decidiram na década de 1970 que eles iriam abandonar a classe trabalhadora e brincar de política identitária, e a classe trabalhadora lhes tratou com descaso. [Hillary Clinton] perdeu todos os estados do “rust belt”. Você realmente tem que trabalhar muito para perder os estados do “rust belt” se você for um democrata. Então, eles conseguiram exatamente o que se esperava. E todos os esquerdistas estão preocupados que Trump é um demagogo de direita. Isso é insano – ele é um liberal. Ele foi um apoiador de Clinton. Digo, você poderia dizer que ele é um oportunista, ele é narcisista, mas ele não é um demagogo de direita. Eu não acho que ele é nem um pouco mais narcisista ou oportunista que Newt Gingrich, eu não acho que ele é nem um pouco mais narcisista ou oportunista que Hillary Clinton. Eu não acho que o que aconteceu nos Estados Unidos é de fato uma surpresa. Acho que a esquerda está dizendo “Meu deus, isso é uma catástrofe”. Não é uma catástrofe maior do que Margaret Thatcher ou Ronald Reagan no que se refere a até onde a demagogia de direita vai. Eu não acho que isso é nem um pouco diferente da revolução de Reagan, ou o que aconteceu com Thatcher, em termos de seriedade. Trump é um moderado. Ele é um moderado barulhento, e ele é um pouco populista, mas fundamentalmente ele ainda é um moderado – e as pessoas estão reagindo como se ele fosse Hitler. Você poderia pegar um Hitler – e ele certamente não é Trump. Ele era um candidato qualificado? Não, eu não acho era, mas ele fez várias coisas certo, e uma delas foi que ele não deu o mesmo discurso enlatado o tempo todo, e ele não foi manipulado até à morte. As pessoas viram isso e pensaram “ele não está fabricando cada declaração. Ele é meio que um idiota, mas pelo menos nós sabemos o que ele pensa”. Então as pessoas foram à cabine de votação, e elas pensaram “que se foda, vou votar no Trump” e foi isso que elas fizeram. Foi igual ao Brexit. A esquerda forçou a barra, esculhambou demais, e as pessoas pensaram “nós não vamos mais aguentar isso”, e então os democratas abandonaram a classe trabalhadora. Eu não sou um admirador do [Bernie] Sanders porque eu não acho que o tipo de socialismo que ele promove é uma solução defensável, mas eu certamente entendo que a classe trabalhadora nos Estados Unidos tem sido avacalhada desde 1975. Suas instituições sociais estão desmoronando, seus salários têm sido aplainados, os avanços da Índia e da China têm todos sido colocados nas costas da classe trabalhadora americana. Daí os intelectuais pensam ‘oh, esses caipiras, eles são estúpidos’. Pessoas de negócios NÃO são estúpidas. De fato, elas tendem a ter muito mais senso do que muitos dos intelectuais que eu conheço, ainda que não sejam tão boas em articular seus argumentos.
Como você define justiceiros sociais?
Eles são aqueles que transformam a compaixão em arma.
Você vê a cultura da justiça social como uma ameaça à democracia, e por quê?
Absolutamente. Não há nada sobre os tipos autoritários do PC [NT: politicamente correto] que tenha qualquer gratidão para com qualquer instituição. Eles têm um termo – patriarcado. Isso engloba tudo. Isso significa que tudo que nossa sociedade é está corrupto. Não há linha, eles querem dizer tudo. Vá online, vá checar dez websites de estudos femininos. Escolha-os aleatoriamente. Leia-os. Eles dizem ‘a civilização ocidental é um patriarcado corrupto até seu maldito núcleo. Nós temos que derrubá-la’.
O que significa democracia, o que significa liberalismo, o que significa direitos humanos.
Significa a coisa toda. O edifício inteiro. E ao que eles a comparam? À utopia. Por que você acha que feministas iriam atrás de Ayaan Hirsi Ali? Ela é uma heroína, aquela mulher. Ela é da Somália. Ela cresceu em um patriarcado muito opressor – um real. Ela escapou de um casamento arranjado, e se mudou para a Holanda e se apaixonou pela Holanda. Duas coisas realmente lhe chocaram inicialmente antes de ela ir à universidade e se tornar uma estudante do Iluminismo. Número um – ela esperava em um ponto de transporte público, e uma placa digital diria quando o transporte público iria chegar, e ele chegava exatamente quando o placar disse que iria. Isso era inacreditável para ela. E outra coisa que ela não conseguia acreditar era que a polícia lhe ajudaria. Você sabe que está num país civilizado quando a polícia não lhe estupra e rouba tudo que você tem. As pessoas radicais de esquerda não dão a mínima para nada disso.
Há algo mais que você gostaria de adicionar?
Você perguntou o que as pessoas podem fazer. Elas podem se recusar. Elas podem se recusar a serem empurradas mais nessa direção. Tudo que é predicado sobre identidade de grupo, nós temos que nos livrar disso. Os habitantes de Alberta eram muitos céticos sobre Pierre Trudeau e todas as suas mudanças, especialmente com a introdução da Carta [Estatuto de Direitos Humanos], e eles estavam certos sobre isso também. Nós nunca devíamos ter tido um projeto de lei de direitos humanos no Canadá. Isso foi uma importação da Lei Civil Francesa colocada sobre a Lei Comum Inglesa, e isso foi um erro. Na Lei Comum Inglesa, você tem todos os direitos que existem exceto aqueles que são expressamente proibidos na lei. No sistema francês, você enumera os direitos das pessoas – isso faz parecer que direitos são concedidos para você pelo governo, e isso não é verdade. Então nós começamos a falar mais sobre identidade no Canadá, e isso foi um desvio da tradição do individualismo iluminista.
Você está negando a existência de discriminação baseada em sexualidade ou raça?
Não acho que as mulheres tenham sido discriminadas, eu acho esse argumento chocante. Antes de tudo, você sabe quanto dinheiro as pessoas tinham pra viver em 1885, em dólares de 2010? Um dólar por dia. A primeira coisa que nós vamos estabelecer é que a vida era uma droga para todo mundo. Você não vivia muito. Se você fosse mulher, você estava grávida quase o tempo todo, e você estava cansada e meio morta quando estivesse com 45. Homens trabalhavam sob condições abismais que nós não podemos nem imaginar. Quando George Orwell escreveu O Caminho para Wigan Pier, os mineiros de carvão que ele estudou andavam para trabalhar duas milhas debruçados em um túnel antes que começassem seu turno. Então eles andavam de novo. [Orwell] disse que ele não poderia caminhar 200 jardas em um daqueles túneis sem ter cólicas tão fortes que ele não podia nem se levantar. Aqueles caras não tinham os dentes por volta dos 25, e estavam acabados aos 45. A vida antes do século XX para muitas pessoas era brutal além de comparação. A ideia de que mulheres eram uma minoria oprimida sob aquelas condições é insana. As pessoas trabalhavam 16 horas por dia ganhando apenas para sobreviver. Minha avó era esposa de um fazendeiro em Saskatchewan. Ela me mostrou uma foto da lenha que ela cortava antes do inverno. Eles viviam numa cabana que não era maior do que o primeiro andar desta casa. E a pilha de lenha que ela cortava era três vezes tão longa, e da mesma altura. E isso era o que ela fazia em seu tempo livre porque ela também estava cozinhando para uma turma de debulhadores, tomando conta de seus quatro filhos, trabalhando nas fazendas de outras pessoas como empregada doméstica, e tomando conta dos animais. Então, no século XX, as pessoas ficaram ricas o suficiente para que algumas mulheres pudessem trabalhar fora de casa. Isso começou na década de 1920, e acelerou de verdade durante a Segunda Guerra Mundial porque as mulheres eram puxadas para fábricas enquanto os homens partiam para a guerra. Os homens lutaram, e morreram, e isso é basicamente a história da humanidade. E então na década de 50, quando Betty Friedan começou a reclamar sobre a situação das mulheres, era assim, os soldados voltaram para casa da guerra, todo mundo começou uma família, as mulheres saíram das fábricas porque queriam ter filhos, e foi então que elas ficaram todas oprimidas. Não havia igualdade paras as mulheres antes da pílula anticoncepcional. É completamente insano assumir que qualquer coisa assim pudesse ter possivelmente acontecido. E as feministas acham que produziram uma revolução na década de 1960 que liberou as mulheres. O que liberou as mulheres foi a pílula, e nós vamos ver onde isso vai dar. Há alguma evidência que mulheres que usam pílula não gostam de homens masculinos por causa das mudanças no balanço hormonal. Você pode testar a preferência de uma mulher por homens. Você pode lhe mostrar fotos de homens e mudar a largura da mandíbula, e o que você encontra é que mulheres que não usam pílula gostam de homens de mandíbula larga quando estão ovulando, e gostam de homens de mandíbula estreita quando não estão, e os homens de mandíbula estreita são menos agressivos. Bem, todas as mulheres usando pílula agem como se não estivessem ovulando, então é possível que muito da antipatia que hoje existe entre mulheres e homens exista por causa da pílula anticoncepcional. A ideia de que as mulheres foram discriminadas através do curso da história é chocante.
Agora, grupos que foram discriminados. Sobre o que você está falando? As únicas sociedades que não são sociedades escravagistas são democracias ocidentais iluministas. É isso. Comparadas à utopia, são uma droga. Mas comparadas a qualquer outra coisa – as pessoas não imigram para o Oriente Médio para morar lá, e há boas razões para isso.
A única outra coisa a fazer é uma análise multivariada. Por exemplo, se nós quiséssemos predizer o sucesso de longo prazo da vida em países ocidentais, os dois melhores preditores são inteligência e conscienciosidade. As pessoas inteligentes chegam lá antes, as pessoas conscienciosas trabalham duro. Isso é responsável por cerca de 30 por cento da variância em sucesso de longo prazo na vida. Não há discriminação aí, só competência. E sobre mulheres e o teto de vidro [metáfora que sugere que há barreiras invisíveis ao sucesso das mulheres]? Isso é muito mais complicado do que parece. Por exemplo, eu tenho lidado com muitas empresas grandes de advocacia por anos. Eles não conseguem manter suas mulheres. Todas as grandes empresas de advocacia perdem todas suas mulheres quando elas estão em seus trinta. Você sabe por quê? É fácil. As mulheres se relacionam com pessoas através e acima na hierarquia de domínio, logo mulheres em grandes empresas de advocacia que já passaram dos 30 e que são casadas, talvez elas estejam ganhando $300000 por ano. Seus parceiros também. Eles não precisam ganhar $600000 por ano. Se você quer ganhar $300000 por ano como advogado, essa é sua vida: você trabalha 60-80 horas por semana sem parar, e você está de sobreaviso. Se o seu cliente japonês lhe liga às 3:00 em uma manhã de domingo, sua resposta é ‘sim, eu farei isso imediatamente’ porque eles estão lhe pagando $750 por hora. Essas mulheres têm alta conscienciosidade, são ótimas estudantes, brilhantes na escola de direito, e estelares em seu período de treinamento. Então elas encontram um parceiro, e elas pensam ‘por que diabos eu estou trabalhando 80 horas por semana?’, porque é isso que pessoas sãs pensam. Então só há homens no pináculo absoluto das profissões. Mas não são todos os homens, são essa pequena proporção de homens estranhos. Eles têm QIs de 145 ou mais, e eles são insanamente competitivos e trabalhadores. Não interessa onde você vai colocar uma pessoa assim, ela vai trabalhar 80 horas por semana. A razão pela qual homens fazem isso mais do que mulheres é que o status faz dos homens sexualmente atraentes. Homens são direcionados por status – tanto biológica quanto culturalmente – de uma forma que mulheres não são. Então a questão real, quando você olha essas posições e pensa ‘oh, essas são posições luxuosas, maravilhosas, de plenitude e relaxamento’. Isso é bobagem. Essas pessoas trabalham tanto que é quase inimaginável. Muitas pessoas não só não podem fazer isso, mas não há nem uma chance de que elas gostariam de fazê-lo. Muitas mulheres firmam um relacionamento em seus 30. A parte engraçada é que quando você está nos seus trinta é que só então você realmente começa a ter sua própria vida. Quando você tem 18, você é igual a qualquer outro cabeça-dura de dezoito anos, vocês são todos iguais. Pela época em que você tem trinta, você tem experiência idiossincrática suficiente pra meio que moldar sua própria vida, e muitas pessoas se dão conta que ‘bem, eu não quero trabalhar 80 horas por semana’. Querem ter uma família, e não têm tempo. E quando têm uma família, descobrem que ter um filho – não é um bebê genérico, é uma nova pessoa na sua família. Aquela nova pessoa é A coisa mais importante para você. Ponto. Então as mulheres chegam aí, elas têm dois filhos e elas pensam ‘eu só vou ter filhos pequenos por cinco anos, você acha que eu vou trabalhar por oitenta horas por semana? Para ganhar um dinheiro de que não preciso? Fazendo algo de que não gosto? Ou eu vou passar tempo com meus filhos?’ Eles não conseguem manter mulheres na advocacia – não há um maldito teto de vidro. As profissões do direito estão desesperadas para manter pessoas qualificadas porque elas não têm o suficiente. Elas as buscam de qualquer lugar – especialmente as mulheres que não só são boas advogadas, mas que também podem gerir um negócio. Esse é apenas um pequeno segredo feio sobre a diferença nas estruturas de poder entre homens e mulheres. Os homens fazem quase todos os trabalhos perigosos, os homens trabalham na rua, os homens são muito mais propensos a se mudar do que as mulheres são. Então, se você olha, se você desmonta as estatísticas em termos de salário diferencial, se você equaliza para os outros fatores, mulheres jovens ganham mais dinheiro do que homens jovens. A ideia de que “mulheres ganham $0,70 para cada dólar que um homem ganha” é uma mentira. Pequenos negócios mantidos por homens ganham muito mais dinheiro do que pequenos negócios mantidos por mulheres. Por quê? Porque mulheres começam pequenos negócios quando elas têm filhos, quando elas estão em casa, então os negócios são apenas de meio período. Então é por isso que elas não fazem tanto dinheiro. Não tem nada a ver com preconceito, tem tudo a ver com opções. Então esses argumentos que as pessoas fazem sobre preconceito não estão nem fora da psicologia tribal ainda.
Nós fizemos avanços inacreditáveis em termos de nivelar o campo de jogo, e muito disso foi devido à pura cobiça capitalista. Em sociedades capitalistas, as pessoas são desesperadas por talento. Se elas tiverem que trabalhar com mulheres e minorias, elas geralmente vão. Transformações estão ocorrendo tão rápido que não há nada que você possa fazer para fazê-las ir mais rápido. Todo mundo está gritando ‘preconceito’ – é o pau-para-toda-obra das explicações. Por que a sociedade é assim? Preconceito. Por que ela é assado? Preconceito. Não há nenhum raciocínio envolvido, nenhuma análise multivariada. Isso é repreensível. Warren Farrell escreveu o livro Why Men Earn More [NT: Por que os Homens Ganham Mais]. Ele trabalhava na Organização Nacional das Mulheres em Nova York antes de ter escrito o livro. Ele de fato escreveu o livro, pelo menos em princípio, para suas filhas, porque ele queria ajudar a guiá-las para um status superior. Ele fez uma análise multivariada. Ele foi e viu, e aprendeu mais. Ele descobriu que homens fazem os trabalhos comerciais que pagam mais, são empregos perigosos, são na rua, fazendo trabalho físico duro. Então essas são as outras razões também. Há discriminação com certeza, mas ela conta por talvez dez por cento da variância no sucesso.
Por Jason Tucker e Jason VandenBeukel, em C2C Journal, 1º de dezembro de 2016. 

sexta-feira, 25 de novembro de 2016

Instituições criminosas - OLAVO DE CARVALHO

Instituições criminosas
Olavo de Carvalho
Diário do Comércio, 29 de outubro de 2015
          

Já comentei aqui, brevemente, a pesquisa da CNT sobre a queda da confiança popular nas várias instituições e a do Datafolha que mostra o abismo de diferenças entre a opinião popular e a dos políticos. (Veja meu artigo descrédito_geral e as fontes: http://imguol.com/blogs/52/files/2015/07/pesquisa-cntmda-128-relatorio-sintese.pdf  e politicos-brasileiros são mais liberais do que o eleitorado diz pesquisa.)
O confronto dos resultados leva a uma conclusão inexorável: no sistema representativo brasileiro, os representantes não representam a vontade dos representados.
Tampouco a representam o poder executivo, os juízes, os comandantes militares e outras excelências cujas opiniões majoritárias seguem as dos políticos, não as do povo,  o qual por isso mesmo, como se vê na pesquisa da CNT, não confia em nenhuma dessas criaturas nem vê nelas os porta-vozes dos seus interesses.
Pura e simplesmente, não há um sistema representativo no Brasil. Há um sistema de coleta de votos para candidatos pré-selecionados segundo os interesses do grupo dominante e uma máquina de drenagem de impostos para sustentar nos seus cargos os antagonistas diretos e cínicos do povo brasileiro.
Por isso mesmo, todo discurso anticorrupção que se baseie na defesa das “nossas instituições” é uma fraude que tem de ser denunciada tanto quanto a corrupção mesma.
Essas instituições, cujo conjunto forma a “Nova República”, foram concebidas justamente para isolar e proteger a elite governante, tornando-a inacessível ao clamor popular.
Quem, senão as belas “instituições”, deu ao executivo os meios de aparelhar o Estado inteiro e fazer dele o instrumento dócil dos interesses partidários mais sórdidos e criminosos?
Quem, senão as “instituições”, permitiu que se elegesse uma presidente numa eleição secreta e opaca, blindada antecipadamente contra qualquer possibilidade de auditagem?
Quem, senão as “instituições”, permitiu que o Estado se transformasse no protetor de toda conduta marginal e criminosa, fazendo do Brasil o maior consumidor de drogas do continente, o maior promotor de violência contra os professores nas escolas e um dos recordistas mundiais de assassinatos?
Quem, senão as maravilhosas “instituições”, permitiu que um povo majoritariamente conservador e apegado a valores cristãos fosse representado na Câmara e no Senado por esquerdistas empenhados em fazer tudo ao contrário do que esse povo quer?
Quem, senão as sacrossantas “instituições”, permitiu que as escolas infanto-juvenis se transformassem em academias de sexo grupal, quando não em matadouros de professores, reduzindo as nossas crianças à condição de imbecis violentos, prepotentes e hiper-erotizados que anualmente tiram os últimos lugares nos testes internacionais mas tirariam os primeiros se fosse concurso para ator pornô ou cafajeste-modelo?
Quem, senão as “instituições”, desarmou a população brasileira ao mesmo tempo que, paparicando as Farc tão queridinhas do PT, permitia que os bandos de criminosos se equipassem de armas melhores e mais potentes que as da polícia?
Quem, senão as “instituições”, deu aos criminosos que nos governam o poder de burlar o quanto queiram o processo legislativo, legislando através de decretos administrativos, portarias ministeriais e até regulamentos departamentais?
Quem, senão as “instituições”, permitiu que ONGs de quadrilheiros armados fossem não só financiadas com gordas verbas federais mas se beneficiassem de toda sorte de privilégios ao ponto de tornar-se integrantes extra-oficiais do aparelho de Estado?
Quem, senão as “instituições”, permitiu que o Parlamento se superlotasse de pseudo-representantes eleitos sem votos, pela mágica dos acordos interpartidários – um artifício que, por si, já basta para fazer do sistema representativo inteiro uma palhaçada?
Releiam a Constituição de 1988, o Estatuto da Criança e do Adolescente, a legislação eleitoral, etc. etc. e digam se o descalabro dos governos petistas já não estava todo lá em germe, apenas aguardando a oportunidade macabra de saltar do papel para a realidade.
Sob qualquer aspecto que se examine, as instituições que pesam sobre nós são indefensáveis. Fazer de conta que a roubalheira comunopetista atenta contra elas, ou constitui um risco para elas, é inverter a realidade das coisas. A roubalheira tudo deve a essas instituições. Elas são as mães e protetoras do crime institucionalizado.
Por isso é que todo movimento soi-disant de oposição que se concentre exclusivamente num pedido de impeachment da Sra Dilma Rousseff, em vez de exigir a imediata destituição de todos os astros e estrelas do sistema, é um erro na melhor das hipóteses; na pior, um engodo proposital.
Depois de quarenta anos de monopólio esquerdista da mídia, das universidades, dos movimentos de rua, das verbas oficiais, dos cargos públicos e de tudo quanto existe; depois de políticas insanas que levaram o Brasil a tornar-se o país mais assassino e o maior consumidor de drogas do continente; depois da completa destruição da alta cultura e do sistema educacional no país; depois dos maiores episódios de corrupção da história universal; depois do desmantelamento da agricultura nacional por grupos de invasores financiados pelo Estado; depois da expulsão de milhares de brasileiros das suas terras, para dá-las a ONGs indigenistas, depois de tudo isso o "resgate da nacionalidade" há de constituir-se da simples remoção da sra. Dilma Rousseff da presidência da República? Será que os oposicionistas se uniram ao PT no empenho de gozar da nossa cara?

OLAVO DE CARVALHO E OS FATOS MIRACULOSOS - PARTE 1 - VÍDEO


sábado, 22 de outubro de 2016

EU LI O LIVRINHO DE BLACK BLOCS DE ESTHER SOLANO E WILLIAN NOVAES - Flavio Morgenstern

Após de causarem no Jô e no Pânico, Esther Solano e Willian Novaes chamaram atenção com seu livro sobre black blocs. É pior do que se pensa.
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Esther Solano, Bruno Paes Manso e Willian Novaes causaram um frisson nessas semanas apresentando seu livro sobre black blocs: Mascarados: A verdadeira história dos adeptos da tática black bloc. Sobretudo após se desentenderem com Jô Soares no Programa do Jô e com Carioca no Programa Pânico, mostrando que baixaria os acompanha onde quer que vão.
Como eu mesmo escrevi um livro sobre o movimento de massa brasileiro que teve seu auge físico em junho de 2013 (mas é anterior e continua acontecendo), também falando de black blocs (Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs, as manifestações que tomaram as ruas do Brasil), e como já havia lido o livro dos três autores, muitos me pediram para comentar os autores.
Odeio textos em primeira pessoa, mas preciso falar em primeira pessoa para falar do que odeio, e para tal empreitada. Desculpem-me. Sobretudo, desculpem-me o tema: algo assim só vale não pelo conteúdo em si, mas como contra-exemplo de como está a situação de mentalidade e de pesquisa, jornalismo e academia no Brasil. No mais, vale para dar umas risadas no processo de diagnóstico.
Quando o livro de Esther Solano e sua trupe foi lançado, o meu estava em revisão final com a editora Record. Já havia lido milhares (vários milhares) de páginas de livros opostos ao meu ponto de vista, citando-os às mancheias em meu próprio cartapácio.
Flavio Morgenstern com livros de esquerda, incluindo "Mascarados: a verdadeira história dos black blocs", de Esther Solano, Bruno Paes Manso e Willian Novaes. Arquivo Pessoal.Despiciendo dizer que minhas opiniões são também diametralmente opostas às do Trio Parada Dura. Mas não foi por isso que eu li, estudei e citei livros de pessoas radicais de quem discordo radicalmente, uma camarilha variando do stalinista Slavoj Žižek ao black blocker Francis Dupuis-Déri – mas não citei uma linha sequer de Esther Solano, Willian Novaes e Bruno Paes Manso.
Alguns livros dos quais discordo valeram para serem criticados, ou para explicar o que pensa a esquerda citando-os como fonte direta. O livrinho sobre black blocs dos três, ao contrário, é muito ruim. O pior de todos que li a respeito. Simplesmente porque não é um livro com pesquisa (isso de que tanto se jactam de terem feito): é o livro que menos sabe a respeito sobre o assunto de que falam.
A famosa Lei de Rothbard: acadêmicos se especializam naquilo em que são piores. Talvez Esther Solano, Bruno Paes Manso e Willian Novaes entendam muito de vinhos caros. Ou de Angry Birds. Ou talvez de mecânica de fluídos. Talvez tudo isso sem “pesquisa” nenhuma. Mas, mergulhando fundo na esterilidade desértica do academês, aquela linguagem que ao invés de produzir conhecimento, produz documentos (e livros e papers lidos apenas por quem quer criar novos livros e papers), o que inventaram de “pesquisar” na vida é o que menos entenderam.
Novamente, frise-se, não é por que eu discordo dos autores politicamente. O livro do MPL, por exemplo (20 Centavos: A luta contra o aumento, com o líder do movimento sem líderes Marcelo Pomar e o professor da USP Pablo Ortellado, um dos principais nomes das ocupações de escolas, do MPL e da nova esquerda de revolução 2.0 no Brasil), tem uma ideologia política ainda mais radical do que a do triozinho. Mas ao menos é um livro que sabe do que está falando.
É um livro que conta como o MPL é um coletivo “transpartidário” (embora se venda como “apartidário”), e até tem informações inéditas – foi a única fonte que encontrei que conta, por exemplo, que no dia 6 de junho de 2013, na primeira manifestação que geraria aquela quizomba, o MPL tinha uma reunião marcada na prefeitura de São Paulo, talvez com ninguém menos do que Fernando Haddad. Por isso, faz sua primeira arruaça na frente da prefeitura, num teatrinho que deixou Haddad assistindo tudo sem reação de seu próprio gabinete:
Apostando na estratégica clássica (sic) do Passe Livre, a manifestação passa rapidamente pelo prédio da prefeitura em direção ao Vale do Anhangabaú e dali à Avenida 23 de maio, uma das principais vias expressas da cidade. (p. 29)
Apenas quem leu tal livro (ou o meu, onde dedurei a artimanha) ficou sabendo da mentira que foram posteriormente os gritos do MPL de que “faltava diálogo” com a prefeitura, sendo que antes de tudo recusaram uma reunião para resolver o problema de junho de 2013 em 10 minutos de conversa civilizada.
Black bloc com extintor de incêndioSolano, Novaes e Paes Manso não trazem nenhuma informação nova. É difícil saber o que alguém poderia aprender sobre black blocs após suas 287 páginas e surpreendentes quatro referências bibliográficas, para mostrar como pesquisa é mesmo o forte desses três autores. Meu livro possui 29 páginas elencando referências. Talvez Esther Solano queira discutir “dados” e bater no peito dizendo: “Eu sou pesquisadora!” para se eximir de argumentar ao falar comigo, como tentou fazer com Carioca no Pânico. Fica o convite.
Foi o que eu já havia denunciado em um post na minha página no Facebook de agosto de 2015, quando justamente Solano e Ortellado eram as fontes que Mônica Bergamo (aquela que ninguém no jornalismo chama de esquerdista, muito menos de radical) usou para mapear negativamente as manifestações pelo impeachment de Dilma Rousseff. Diga-se, Esther Solano não cansou de repetir que foi à Paulista mapear “quem pedia golpe militar”. Todos os 0,01%, que xingavam e eram xingados pelo restante do povo.

A tal pesquisa da tal pesquisadora

O livro “Mascarados”, com seu subtítulo pretensioso “A verdade história dos adeptos da tática black bloc”, é dividido em quatro partes. Cada um dos autores mostra sua “pesquisa” e, por fim, há uma entrevista com o Coronel da PM Reynaldo Simões Rossi.
Esther Solano, ladies first, enrola (como nos dois programas) para afirmar se defende ou não black blocs. Afinal, “é pesquisadora”, portanto, é “imparcial”. Como ralha contra Carioca no Pânico, “eu tenho um lado como indivíduo, não como pesquisadora. Você realmente não entendeu isso? Essa limitação?”. Depois de muito enrolar, murmura que não concorda com a tática black bloc e, por alguma superstição edimacediana, tem fé que consegue disfarçar de alguém com QI acima do de Paulo Henrique Amorim qual a sua posição política (o que seria o mesmo que dizer o que defende, mas teria o agravante da honestidade).
Sua retórica é malemolente como gelatina em terremoto. Por exemplo, afirma no Pânico e no Jô que foi “desconstruir” e “desmistificar” a visão que as pessoas tinham sobre black blocs. No Pânico, tenta desqualificar Carioca, ao lado de Willian Novaes, afirmando que as pessoas acham que os blockers são riquinhos.
Santiago Andrade, cinegrafista da Band assassinato por um rojão atirado por dois usuários da tática black blocCuriosamente, no seu próprio livro, afirma que seu senso comum lhe “dizia que o Black Bloc estaria composto só por pessoas daquela periferia mais excluída, mais pobre, a periferia negra” e, na linguagem típica do academês esquerdista, que adora misturar o concreto com o abstrato para dar a impressão de ter percebido algo profundo, que é “acostumada a se relacionar, ou forçadas (sic) a conviver com as violências estruturais do país, e cuja resposta seria, de forma natural, outro tipo de violência” (p. 47).
É o problema de quem tenta ser “chocante”, contar “a verdadeira história” que ninguém conhece: não percebe que é justamente o último a ser informado. Alguém aí, que não é pesquisador, inclusive os leitores de manchete que tanto criticamos, por acaso não sabe que há diversas faixas sociais juntas num black bloc? Waaaaw. Quando Solano percebe que, justamente ao contrário de sua própria visão preconceituosa, todos já estão mais bem informados do que ela, se sai dizendo que foi “desconstruir” justamente o contrário (que nem todos os blockers eram ricos). Cara eu ganho, coroa você perde.
Não é a única contradição nos primeiros 15 minutos de programa com o seu próprio livro (que exige que alguém tenha lido antes de ousar falar com ela). Willian Novaes diz que raros blockers são de faculdades públicas, que black blocs não se formam em movimentos estudantis de faculdades públicas como a USP. Talvez ele devesse corrigir sua colega, que escreveu o capítulo “Quem são eles? Do Capão Redondo à USP”.
Com os típicos jogos de palavras como “Embate no lugar de debate” (já debateu com um black bloc?), toda a sua “pesquisa” é citar fontes como Brasil de Fato (sua própria entrevista) e Carta Capital para descobrir que:
1) O black bloc é feito para chamar atenção da mídia, que não prestaria atenção neles sem isso;
2) Que sua violência é um teatro-espetáculo, o que é decorrência de 1);
3) Que é um “revide”, porque violência dos “vândalos” não seria diferente da violência de, por exemplo, um banco cobrar juro por um empréstimo (sempre a confusão entre abstrato e concreto, já quea esquerda domina apenas o imaginário coletivo, temperada com uma dose cavalar de ignorância econômica, que a pesquisadora não pesquisou);
4) Que, decorrência de 3), “a sociedade” é que é violenta, ao chamá-los de vândalos.
Há esquerdistas que, analisando o fenômeno dos novos movimentos de massa, da esquerda 2.0, chegam a novas conclusões. É o caso, por exemplo, de Fábio Malini e Henrique Antoun, em @ internet e #rua, dois organizadores dos “protestos sem organizadores”, que escrevem o único livro da esquerda que deve ser lido pela direita se quiser ter informações sobre o mapeamento digital, a agitação pelas redes, o histórico e as mudanças desde as rodadas de Seattle e o Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN), com explicações das complexas filosofias de Antonio Negri e Pierre Levy para a internet e a revolução pela multidão nas ruas. O livro é tão mal escrito quanto uma poça de vômito de uma sopa de letrinhas, mas, novamente, são dois autores que sabem do que estão falando.
Esther Solano e Willian Novaes no Pânico, da Jovem PanNão é o caso de Esther Solano, que, grossa, antipática, arrogante, mal educada e dona de uma ironiazinha tosca com uma empáfia de quem quer viver de título para esconder um argumento medíocre, escreve páginas e páginas (daquelas começando com “Um ano depois da minha primeira manifestação como pesquisadora da tática Black Bloc, estou escrevendo estas páginas”) apenas para repetir, de diversas maneiras, a narrativa mofada e repetida do vitimismo da esquerda: de que, mesmo que o conhecimento político sobre anarquia dos maloqueiros que se vestem de preto para quebrar coisas aleatoriamente seja mais primitivo do que a noção de educação dos grandiosos “pesquisadores”, eles têm uma mensagem política a passar (não, diga, pesquisadora! não tinha reparado naquele “A” de anarquia gigante na cara deles!). Ah! E são os excluídos da sociedade.
Algo que alguém não soubesse que fosse sair da boca de qualquer blocker se perguntado por que está revoltadinho com o capitalismo e quebrando lojas, bancos de jornal, prédios públicos, agências bancárias e concessionárias pela cidade? São quase 150 páginas com esses clichês. Não servem nem para serem criticadas, como fiz com tantos outros livros em meu próprio.
O pior ainda é a aura de “pesquisa factual” que são simplesmente externalizações de seus sentimentos ao verem manifestações. Dá para ver Esther Solano com a revista Capricho na mão há uns 20 anos. Nada sobre as conseqüências políticas, um comparativo com outros movimentos de massa, uma análise do modelo, fosse política, econômica, moral etc. Nada. Apenas “Querido diário, hoje eu acordei e ainda estou pensando na manifestação de ontem, que hor-ror”.
Black bloc no Occupy Wall Street. Violência contra bancosCompare-se, por exemplo, com dois livros de radicais de extremíssima-esquerda lançados pela Boitempo, a editora mais comunista do país. Um é Occupy: Movimentos de protesto que tomaram as ruas, e outro Cidades Rebeldes: Passe livre e as manifestaçõesq que tomaram as ruas do Brasil. Nenhum dos dois precisa ser lido (tudo já dedurei no meu livro), mas note a coordenação entre um livro lançado em 2012 (dois mil e doze), com comunistas revolucionários do jaez de Slavoj Žižek, David Harvey, Tariq Ali, Mike Davis e Vladimir Safatle analisando como espalhar o movimento Occupy, inclusive com brasileiros no fracassado “Ocupa Sampa” palestrando sobre como criar uma versão brasileira do movimento (primeira dica: descartar os acampamentos, que destruíram o original). Logo depois, um livro curiosamente bem mais fraco, analisando os acertos e falhas de junho de 2013 (neste caso, estão bem mais perdidos).
Em suma: gente que lidera os “movimentos sem líderes”, que coordena aquilo que é “horizontal” (o que os americanos chamam de astroturfing), que analisa dos Anonymous aos black blocs, do Occupy Wall Street ao MPL, em uma variedade de aspectos. Gente que sabe do que está falando e tem informações que não teríamos sem os ler. Já Esther Solano tem como grande “pesquisa” conversar com blockers adolescentes falando que sofrem, e dizer que é a única a ter ouvido sua voz.

O pesquisador playboy

Uma pena que Bruno Paes Manso, o segundo autor do livro, não tenha ido no Pânico. Para quem escreve “a verdadeira história dos black blocs”, sua parte no livro é a mais legal. Afinal, Bruno Paes Manso não fala exatamente de black blocs. Fala de si próprio.
Lá, gastamos um tempo de vida brutal que poderia ser aproveitado praticando pesca de quermesse ou yawn pong  em umas 20 e poucas páginas para dizer que Bruno Paes Manso era um rico, que viveu isso e aquilo, que foi descobrir como pobre pensa ouvindo Racionais MC’s. E depois, páginas e páginas de como foi cobrir os protestos que envolveriam black blocs e de como ficou surpreso com tudo aquilo e que a violência da qual sempre esteve protegido por sua riqueza ficou escancarada.
E conclui com um parágrafo com a seguinte passagem:
As cidades precisam melhorar sua qualidade de vida. Não aguentamos mais shopping center. Devemos aprender a conviver com as diferenças, abandonar os carros, andar de bicicleta. Junho me ensinou que, mesmo depois dos quarenta, não é possível se acomodar quando nos dirigimos ladeira abaixo. Conviver com novas ideias e novas gerações inconformadas foi revigorante. Salve Mano Brown, MPL, Criolo e quem mais estiver disposto a compreender a alma atormentada de São Paulo, para transformá-la. São Paulo precisa de mais amor (…). (p. 187)
Viu o que é “pesquisar”? Qquer apostar quanto que ele odeia o termo universal “esquerda caviar”? Precisamos mesmo é transformar São Paulo numa cidade do Paleolítico inferior.
Ah, nada sobre “a verdade sobre black blocs” ficou claro ainda? Que tal essa pérola para quem escreve um livro “revelador” da Ver-Da-Dei-Ra história dos black blocs, depois de um confronto na Avenida Paulista?
De fato, eu não pertencia àquela geração que, como jornalista, eu precisaria compreender. Antes de partir, já depois da meia-noite, eu pedi um cigarro, depois de dois anos sem fumar. Acendi. “Respirei muito gás. Um cigarrinho não vai fazer mal.” No dia 13 de junho de 2013, voltei a fumar. Muita coisa havia mudado. Quero voltar a largar o cigarro em breve. (p. 169)
Descobriu agora a “verdadeira história dos black blocs”? Se não, pelo menos já conhece a verdadeira história de Bruno Paes Manso. O homem que só descobriu que pobre existe depois dos 30 anos.

Você traiu o movimento punk, véio!

Já Willian Novaes se ocupa das entrevistas do livro, na terceira parte. É, de novo, a “pesquisa de campo”, já que ler um livro antes de escrever um, como vimos, é coisa de somenos importância. Como ensina seu colega Bruno Paes Manso, se você tem um mistério diante de si que não consegue decifrar, ao invés de pesquisar, basta escrever um livro revelando “a verdadeira história” dizendo que não tá entendendo lhufas.
É Willian Novaes quem xinga Carioca, no Pânico, de “louco”, e depois que Carioca rebate, solta várias injúrias. Sua coleguinha Esther Solano passa o restante do programa afirmando coisas como “temos alguns tipos de debate empobrecidos, como aqui é o caso do Carioca”, “é uma pequenês” ou “não respeito seus insultos, respeito a sua opinião”. Não se sabe se respeita os insultos de Willian Novaes.
Logo no começo do Pânico, Carioca afirma, como comentamos, que vários blockers são “playboys, filhinhos de papai”. Esther Solano, cujo único cacoete é se afirmar pesquisadora, responde “vamos voltar aos dados, e não à especulação”, dizendo que “é difícil, viu” conversar com quem não “pesquisou dados” como ela própria.
Dado Dolabella x João GordoBem, os dados são dados (!) pelo próprio Willian Novaes, na terceira entrevista do livro, à página 209. Novaes fala de um rapaz à época com 33 anos, dono de seis negócios, aristocrata das famílias Ortiz e Bartira, com tatuagens incluindo um dístico de Santo Agostinho em latim no peito que mora na riquíssima Avenida Nove de Julho. É o black blocker conhecido por Barão.
O discurso pobrista e vitimista e “você não estudou” dos autores do livro só se sustenta mesmo com quem não leu seu próprio livro. Afinal, a fonte para mostrar como eles estão errados são… eles mesmos, que tanto falaram em “dados”.
Ah, o Barão, o blocker que Willian Novaes finge que não existe para tentar desqualificar o que Carioca já sabia que existia. O Barão não vai pro confronto, óbvio: prefere financiar os blockers pobres para serem bucha de canhão e os peões do seu anarquismo (paga por advogados etc). Prefere… bem… ehrr…
[Barão] Lembra das suas ações diretas individuais, de “desapropriação”. “Quando vou ao supermercado, sempre pego algo escondido. E no banco roubo uma revista. Também, quando a máquina engole o meu cartão, dou vários murros. Precisamos parar de ser omissos.” É, ainda falta muito para os objetivos concretos de Barão serem alcançados. (p. 217)
Entendeu a “verdadeira história dos black blocs” que Willian Novaes tem a revelar agora?
Tem lá também umas entrevistas com mulheres. Algumas páginas depois de Bruno Paes Manso jurar de pés juntos, sem prova nenhuma, que Fábio Hideki, famoso blocker uspiano, foi preso e levou uma sessão de socos (se Hideki diz…) por ser um líder black blocker, “sendo que o black bloc nem tem líderes”, está lá o pimpão Willian Novaes falando da blocker Mana: “ao redor da estação Carrão do Metrô, na zona Leste de São Paulo, vimos a garota de cabelos vermelhos liderando os Black Blocs” (p. 231).
Ué…
“Todos ouviam e obedeciam aos gritos estridentes da garota de cerca de cinquenta e três quilos”. O capítulo inteiro é uma descrição de como a blocker Mana manda nos manos, ordenando que atirem pedras na PM quando inventam de fugir, pegando microfone para “comandar um ato pela liberdade de dois jovens presos pela Polícia Civil” etc.
Depois de relatos e mais relatos mostrando o problema fundamental da maioria (pais ausentes), não entendemos como tais pesquisadores tarimbados, professores, jornalistas de grandes publicações como Istoé, conseguem a façanha de não entender a crítica de Carioca, ao afirmar que o problema são famílias desestruturadas, e não causas econômicas (do contrário, todo pobre seria black blocker, mas essa lógica é difícil demais para os marmanjos).
Bem, na verdade, entendemos sim. O que dizer de alguém que escreve tal passagem?
“Uhuuuu, uhuuuu, uhuuuu”, é o grito de guerra dos Black Blocs para se motivarem e alertarem a todos que dali para frente o bicho vai pegar. (p. 243)
Ainda bem que foram a campo fazer pesquisa para nos contar a verdadeira história!
Conclui a pesquisa aquela musiquinha do Caetano Veloso “Caminhando contra o vento”, com tanto conteúdo no predicado quanto conteúdo na cabeça de quem flerta com isso. E fim.

Black blocs de esquerda? Magina!

Este é o livrinho dos autores que se acham a última Tubaína da favela por terem escrito um livro. A julgar pelo esforço de cada um, se o escreveram em seis meses, daria para escrever um pouco mais de uma página de Word por dia e sobraria. Este artigo faria algo como uns 10 livros deles em seis meses. Sozinho.
Nada contra livros curtos, mas… qual o conteúdo dessa estrovenga? Descobrir que black bloc também é gente e que pobre existe? Azeitar tudo com papo vitimista, reduzir no discurso “imparcial” do academês e depois ir para a mídia xingar seus anfitriões por eles criticarem a violência?
Black bloc no Occupy Wall Street: "All my heroes kill cops" (Todos os meus heróis matam policiais).Claro, aí é a hora de sacar o manual de palavrinhas de obediência imediata do bolso e dizer que “vivemos um momento delicado, não conseguimos dialogar”. Repetindo: a turma que escreve livro incensando BLACK BLOCS quebrando tudo sem motivo reclama quando alguém diz que eles são playboys, reclama que precisamos dialogar porque há muito extremismo. Qual a melhor forma de diálogo para eles? Entrar ali na sala e tacar fogo em tudo? Alguém aí sabe o número da placa do carro de cada um?
A sorte dos autores, com a qual eles contam, é que ninguém vai ler um livrinho tão ridículo quanto o deles. Tanto que cobram fontes que os refutariam… que estão exatamente em suas páginas, enquanto Esther Solano se emperequeta dizendo “está medíocre, difícil responder a isso”, sem se tocar que se arvora como uma “pesquisadora” cujo grande livro é só um diário íntimo com adesivos da Hello Kitty no canto de cada página.
No programa do Jô Soares, Esther Solano solta frases medíocres e burras como narrar o pensamento blocker como “eu sou vândalo porque tô jogando pedra, e o banco é vândalo porque está cobrando taxa de juros”, e mais uma vez tenta surpreender com obviedades, afirmando que não havia um líder claro, “ao contrário do que se pensa”. Jô, que apesar de jurar ter visto uma suástica no meio de um black bloc que ninguém mais viu, respondeu o que todo mundo responderia: “É bem claro que não há chefe, desde a primeira manifestação”. Toda uma “pesquisa” que, quando acerta alguma verdade, é um óbvio ululante a todos os não-pesquisadores.
Jô terminou criticando um livro com subtítulo tão pretensioso, já que não teriam como contar “a verdadeira história” de uma maneira tão cabal. Os autores, mais uma vez, tentaram dizer que são várias histórias contadas. As primeiras palavras do livro são:
A realidade, se existe, é um poliedro. (…)
A realidade, se existe, não está composta por verdades absolutas, cânones, ou (sic) rigores ortodoxos e sim por pontos de vista, sentimentos, percepções.
Impor um padrão imutável de entender a vida é mais uma forma de violência.
A realidade, “se existe”. Para relativistas que negam a realidade, a única verdade é o que eles querem impor a nós em determinado momento, para tentar impor o contrário 10 páginas depois.
No Pânico, Esther Solano disse que Carioca não faz jornalismo, só ideologia, por ser contra “ocupação” de escola para dar aula de FEMINISMO (nada ideológico). Willian Novaes apresentou como contraponto que Carioca iria querer aulas de Jair Bolsonaro (quando Carioca só quer, ehrr, aulas). Diz então que Carioca é louco, idiota e otário (sem um esgar de reclamação de Esther Solano pela falta de capacidade de diálogo de seu colega co-autor).
Alguém poderia até imaginar, depois disso, que os autores pesquisaram mesmo, passaram incontáveis horas/bunda lendo e estudando o fenômeno, meditando nas suas conseqüências, avaliando seus métodos, traçando cenários possíveis, sopesando a distância entre suas idéias e sua consubstanciação.
Foi o que fiz em meu modesto Por Trás da Máscara: do passe livre aos black blocs, as manifestações que tomaram as ruas do Brasil. Bem ao contrário dos pretensiosos pesquisadores com 4 livros de pesquisa, não saí xingando alguém para depois reclamar da falta de nível do debate (vide meu painel noV Seminário da Polícia Civil com o professor Germano Schwartz nesta semana, onde levo exatamente o risível livrinho dos autores para comentar).
Já os pretensos pesquisadores esbravejando “Como assim, velho?” quando Carioca apontou o óbvio (que quem paga por destruir uma agência bancária é o pobre, o que escapa formidavelmente a três pimpões tentando fazer análise político-econômica) só conseguem mesmo é serem os jornalistas metidos a manos. Vide a treta no Pânico:

Ah, ops. Desculpem, link errado. O certo é esse:

Mas até você confundiria também, não é?
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