sábado, 7 de fevereiro de 2015

Mais de 65% dos investimentos em portos encalham Gabriela Salcedo - Contas Abertas


Apesar do setor portuário ser responsável por mais de 90% das exportações brasileiras, a retração do movimento comercial está cada vez mais comum. Difícil seria esperar por outro resultado, já que ano após ano, os investimentos das Companhias Docas ficam aquém das previsões. Em 2014, foram pagos apenas R$ 487,7 milhões do R$ 1,4 bilhão autorizado, o que equivale a 34,1%. Comparado com o percentual de execução dos investimentos em exercícios anteriores, observa-se uma singela melhora no ano passado. Em 2013, por exemplo, 28,3% do valor autorizado foi aplicado em obras e compras de equipamentos. 

Contudo, em valores absolutos, houve redução do total aplicado em 2014 de R$ 8,3 milhões, já que as Companhias Docas executaram R$ 496 milhões no ano retrasado. Veja tabela completa aqui. As relações entre o orçamento realizado e o autorizado demonstram constância da baixa eficiência no uso dos recursos federais destinados às Companhias Docas, das quais sete são administradas pela Secretaria de Portos e uma pelo Ministério dos Transportes. 

Apenas em 2000, as empresas conseguiram pagar 50% do previsto para o ano. Salvo esse exercício, a média é de 27,6% de execução ao ano. Segundo o diretor-presidente da Associação Brasileira dos Terminais Portuários, Wilen Manteli, a dificuldade que as Companhias Docas demonstram para executar o orçamento de investimento se deve, em parte, à falta de autonomia. Após a Medida Provisória dos Portos, sancionada pela presidente Dilma em 2013, o poder de decisão das estatais foi ainda mais enfraquecido. A centralização do poder de decisões no governo, de acordo com o especialista, tende a padronizar todos os portos da administração pública federal. 

“O Porto de Rio Grande, por exemplo, concorre com portos argentinos, uruguaios e com o de Santa Catarina e Paranaguá. Para baixar tarifa e se tornar mais competitivo, eles são obrigados a ouvir Brasília. Um país do tamanho do Brasil devia delegar cada vez mais na gestão portuária,” explica. De acordo com Manteli, as Companhias Docas apresentam outro problema crônico: a forma de indicar diretores. 

A escolha política, para o especialista, se traduz em uma interferência política nociva para as estatais. Ele também considerou como outro retrocesso no sistema portuário a dimensão política que o Conselho de Autoridade Portuária, órgão de gestão, tomou. Segundo ele, anteriormente, o órgão era formado por conselheiros nomeados pelo governo, mas também por empresários e representantes do setor da sociedade civil. “Esse conselho, que vinha sendo fortalecido, foi reduzido e agora a maioria dos conselheiros é do governo federal,” comenta. 

O levantamento do Contas Abertas foi realizado com base na portaria nº 2, de 30 de janeiro de 2015, publicada no Diário Oficial da União do dia 2 deste mês. Os dados estão em valores constantes, atualizados pelo IGP-DI, da Fundação Getúlio Vargas. As informações fornecidas pelas próprias Companhias constituem a única forma de acompanhamento dos investimentos das estatais brasileiras. 

Desempenho das estatais 

A Companhia Docas do Ceará é a estatal do setor portuário nacional que, nos últimos anos, mais bem executa seu orçamento. No ano passado, a Companhia foi autorizada a gastar R$ 132,7 milhões com obras e compra de equipamentos e chegou a aplicar R$ 70,6 milhões, o que corresponde a 53,2%. 

A Companhia Docas do Estado de São Paulo vem em segundo lugar: realizou 50% dos R$ 545,9 milhões orçados, o que representa desembolso de R$ 272,8 milhões. Em seguida, a Companhia Docas do Rio Grande do Norte, que marcou 27,6% de execução, isto é, dos R$ 126,2 milhões orçados, R$ 34,8 milhões foram realmente empregados. 

Ainda próximas às médias anuais, a Companhia Docas do Espírito Santo e a Companhia Docas do Pará executaram, respectivamente, 24,3% e 22,7%. A primeira aplicou R$ 48,4 milhões dos R$ 199,1 autorizados e a segunda, R$ 23 milhões dos R$ 101,3 milhões previstos.

Já as últimas três estatais que administram os portos públicos brasileiros estão muito abaixo da média da série história. A Companhia Docas da Bahia atingiu apenas 14,2% do seu potencial em investimentos, o que significa execução de R$ 24,8 milhões dos R$ 174,4 milhões autorizados. 

A Companhia Docas do Rio de Janeiro se saiu ainda pior. Ela orçou R$ 151,1 milhões para serem gastos ao longo do ano passado, mas só R$ 13,1 milhões foram pagos, o que revela execução de 8,7%. Por fim, a Companhia Docas do Maranhão, que, pelo segundo ano consecutivo, não desembolsou um real dos R$ 40 mil previstos. A Secretária de Portos justificou o baixo desempenho demonstrado por conta de três principais fatores. 

O primeiro é a existência de empreendimentos, cujos recursos não foram repassados para as Companhias Docas em virtude de problemas que levaram a paralisações nas obras, a exemplo das judicializações. Alegou, ainda, o volume e a complexidade das obras do setor portuário e, por fim, grande interdependência de atores externos para a execução dos empreendimentos, tais como as questões ambientais. 

O Ministério dos Transportes informou que os R$ 40 mil previstos à Companhia Docas do Maranhão seriam destinados a compra de equipamentos e materiais permanentes, no entanto, não houve necessidade de tais aquisições. 

Panorama do setor portuário brasileiro 

O último relatório publicado pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), o “Relatório Estatístico Semestral da Antaq”, referente ao primeiro semestre de 2014, revelou que dois dos nove maiores portos brasileiros reduziram a carga movimentada. O único porto administrado pela Companhia Docas do Estado de São Paulo, o de Santos, é a principal porta de entrada e saída das exportações e importações brasileiras. 

Apesar da estatal ter apresentado a melhor execução entre as Companhias, o relatório revela que a movimentação sofreu retração. No primeiro semestre de 2013, 47,9 milhões de toneladas em cargas para exportação saíram pelo porto. 

No mesmo período do ano passado, o peso foi de 44,1 milhões de toneladas. Sendo assim, houve queda de 8% nas exportações realizadas pelo terminal. O comércio dos produtos agrícolas, provavelmente, foram os mais prejudicados, pois mais de 50% da exportação de produtos agrícolas brasileiros são escoados pelo complexo portuário santista. 

O do Rio de Janeiro, o nono mais importante entre os portos organizados do país, também reduziu a movimentação. No primeiro semestre de 2014, 3,9 milhões de toneladas em produtos agrícolas e industriais saíram pelo porto, contra 3,6 milhões de toneladas no mesmo período de 2013. 

Sendo assim, houve retração de 9% nas exportações realizadas pelo terminal carioca. É possível ter uma ideia da importância dos portos na balança comercial favorável do país ao mensurar o quanto do escoamento dos produtos nacionais é efetuado por meio deles. Segundo o relatório, os terminais portuários foram responsáveis por 84% dos recursos arrecadados por meio da exportação. 

Quanto às toneladas, os portos escoaram 98% de toda a carga nacional. O granel mineral é o produto nacional mais requerido internacionalmente. No primeiro semestre do ano passado, o Brasil exportou 160,7 milhões de toneladas de minério de ferro. Como revelou o relatório, quase um terço desse total, 52,3 milhões de toneladas do minério, foi escoado por meio de um único porto privado, o Ponta da Madeira, no Maranhão. Dos 12 portos responsáveis pela saída do produto, apenas dois são públicos. 

Os terminais privados, no geral, ultrapassam os públicos em movimentação de cargas. No primeiro semestre de 2014, os portos públicos exportaram 167,4 milhões de toneladas contra 157,8 milhões de toneladas no ano anterior. Já os portos privados exportaram 292,9 milhões de toneladas no mesmo período do ano passado e 279,7 milhões de toneladas em 2013. 

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