Publicado em 16 de junho de 2016 por Thiago Cortes em ReaçaBlog com 0 Comentários
Nas últimas semanas acompanhei a proliferação de “análises” e “teses” sobre o caso do estupro coletivo no Rio de Janeiro. Outros casos parecidos supostamente aconteceram no Piauí nos últimos dias. Mas ainda estão sendo apurados.
Senti falta de uma leitura menos abstrata e mais “empírica” dos episódios, mas não conseguia verbalizar nada. Até que decidi reler alguns livros de Theodore Dalrymple.
Dalrymple é um psiquiatra inglês que trabalhou em hospitais da periferia e presídios nas cercanias de Londres, além de ter percorrido o Terceiro Mundo e regimes totalitários como a Coréia do Norte e os países fechados da época da Cortina de Ferro.
Dois livros do psiquiatra, “A vida na sarjeta – o círculo vicioso da miséria” e “Nossa cultura…ou que restou dela”, ambos da “É Realizações”, podem nos ajudar a debater a questão.
Algumas considerações iniciais: o estupro é um ato de inominável violência que nunca pode ser justificado. Não há uma vírgula neste texto colocada com o propósito de relativizar qualquer ato de barbárie; defendo a punição exemplar de todos os estupradores.
O que este texto propõe é apenas iluminar o fato de que – uma vez que a Revolução Sexual se realizou – muitos dos tabus que cercavam a sexualidade foram destruídos e, com eles, a proteção que o bom senso oferecia contra abusos e práticas sexuais nefastas.
Até mesmo a expressão “práticas sexuais nefastas” é uma blasfêmia que a nossa intelligentsia e seus jornalistas amestrados combatem com notável ferocidade. Não existe mais sexo nefasto, errado ou feio. Tudo o que importa é alcançar o orgasmo.
Ficou estabelecido o dogma segundo o qual o sexo deve ser sempre livre. Livre das convenções sociais, dos freios morais, das restrições afetivas. Isso nem sequer é mais debatido.
Quais são as consequências?
Ao tomar contato com o autodestrutivo modo de vida da subclasse inglesa – marcada por um empobrecimento mental, moral, cultural e espiritual –, Dalrymple percebeu que uma das fontes de sofrimento da subclasse é o fato dela adotar e viver na prática ideias perversas criadas na academia por intelectuais movidos à abstração e distantes da realidade.
Uma das maiores perversidades gestadas na academia e que hoje envenena as relações humanas é a ideia de que o sexo deve ser livre de constrangimentos morais ou mesmo de restrições legais e que no campo da sexualidade o que vale é apenas o exercício da vontade.
Em seu contato diário com a subclasse inglesa Theodore Dalrymple viu de perto as consequências práticas do “sexo livre”, leia-se descompromissado, que torna todos os relacionamentos e – por consequência todas as pessoas – descartáveis.
“Se alguém quiser ver como são as relações sexuais livres de obrigações sociais e contratuais, dê uma olhada no caos das vidas das pessoas que compõem a subclasse. Aí, toda a gama de tolices, perversidades e tormentos humanos pode ser examinada livremente – em condições, recordemos, de prosperidade sem precedente”(“A vida na sarjeta”)
O psiquiatra prossegue:
“Temos abortos realizados por golpes de kung fu no abdômen; crianças que têm filhos em números dantes desconhecidos em épocas precedentes ao avanço da contracepção química e da educação sexual; mulheres abandonadas pelo pai das crianças um mês antes ou após o nascimento; ciúmes insensatos, que são o reverso da moeda da promiscuidade geral e que resultam na mais odiosa opressão e violência; uma grande parcela de padrastos seriais que acabam violentando física e sexualmente as crianças; e todo tipo de perda de distinção do que é sexualmente permissível ou não”
Animalização do sexo: o retorno do homem das cavernas
O que Dalrymple viu na realidade da subclasse inglesa certamente encontra eco na realidade estupidificante das subclasses brasileiras. Não podemos dissociar os crimes sexuais brutais que acontecem nas periferias do contexto de promiscuidade geral e libertinagem sexual na qual crianças e adolescentes crescem e desenvolvem sua visão-de-mundo.
O sexo descompromissado, desinibido e desenfreado foi idealizado pelos profetas da Revolução Sexual como uma forma de destruir os “tabus opressivos” da sociedade e, assim, de se conquistar a felicidade humana plena para homens e mulheres.
Nós, modernos, aprendemos que a única preocupação que devemos ter no que tange ao sexo é simplesmente a de alcançar a mais completa realização dos nossos desejos.
Ora, o resultado prático de jogar no lixo o significado unitivo do sexo é a total animalização do relacionamento entre homens e mulheres. É o retorno do homem das cavernas.
Graças à Revolução Sexual, fomos reduzidos a animais em busca do coito perfeito.
É dessa brutal animalização do relacionamento entre homens e mulheres que surgem muitas das “patologias sociais” listadas por Dalrymple: meninas que engravidam cada vez mais cedo e de vários parceiros, gerando filhos que sofrem abusos de padrastos que passam por suas vidas de maneira tão rápida quanto brusca, deixando marcas e traumas terríveis.
“Na verdade, a maioria das patologias sociais apresentadas por essa subclasse tem origem em ideias filtradas da intelligentsia. Nada é mais verdadeiro que o sistema de relações sexuais que atualmente prevalece na população da subclasse, cujo resultado é de 70% de nascimentos ilegítimos no hospital em que trabalho.” (“A vida na sarjeta”)
A violência contra as mulheres
É claro que ao reinaugurar entre nós, modernos, a sexualidade desinibida e indomável do “saudoso” tempo do homem das cavernas, os profetas da Revolução Sexual deixaram as mulheres, literalmente, em maus lençóis.
Isso porque os homens não engravidam – o feminismo ainda não conseguiu dobrar a biologia – e podem ter várias parceiras ao mesmo tempo sem maiores preocupações. E, nos conflitos domésticos cotidianos, os homens prevalecem por conta da sua força física superior.
As brigas por ciúmes – que a ideologia também é incapaz de erradicar – representam a causa da maioria das internações de mulheres no hospital em que Darlymple trabalhou.
“Assim, continua a ser verdadeiro o fato de um hospital, como o em que trabalho, ter experimentado nas últimas décadas um aumento enorme no número de maus-tratos à mulher, a maioria dos casos resultado da violência doméstica”. (“A vida na sarjeta”)
Christopher Hitchens dizia que pouco importa o que se pensa, mas como se pensa. E as feministas, senhoras e senhores, pensam errado. Muito errado! Elas enxergaram o que há de pior no mundo masculino e quiseram importar para suas próprias fileiras.
As feministas perceberam que muitos homens usam e descartam as mulheres, mas não enxergaram nisso necessariamente um comportamento errado a ser combatido. O que elas enxergaram foi apenas e tão somente uma injustiça a ser corrigida.
Diante do “homem comedor” acrítico e sexista, agora as feministas reivindicam para as mulheres o direito a serem “vadias” politizadas e autoconscientes que buscam não se proteger da promiscuidade, mas a democratização da promiscuidade sexual.
É óbvio que os homens levam a melhor nessa. A maternidade nunca será para eles uma ameaça possível no horizonte e os deveres da paternidade podem tranquilamente ser compartilhados com um generoso Estado de Bem Estar Social.
Para os homens promíscuos, a vida nunca foi tão boa. As mulheres que se virem com seus filhos bastardos e o acúmulo de traumas e violências trazidos por vários parceiros sexuais, todos extremamente violentos e possessivos, que se impõem pela força.
Dalrymple é enfático ao dizer que as mulheres e as crianças são as maiores vítimas da Revolução Sexual. Algo que as feministas, certamente, jamais poderão admitir.
Se o leitor se impressionou com o dado de que 70% das mulheres que deram entrada no hospital em que o psiquiatra trabalhava eram vítimas de violência doméstica, saiba que o número só não chegou aos 100% por causa dos imigrantes de orientação religiosa.
Eis o verdadeiro legado da Revolução Sexual:
“A revolução foi a pique na rocha da realidade inconfessa: de que as mulheres são mais vulneráveis à violência que os homens exclusivamente em virtude da biologia, e que o desejo da posse sexual exclusiva do parceiro continuou tão forte quanto antes. Esse desejo é incompatível com o desejo igualmente poderoso – eterno nos sentimentos humanos, mas até agora controlado por inibições sociais e legais – de total liberdade sexual”. (“A vida na Sarjeta”).
Os profetas da Revolução Sexual sonhavam com o fim de toda sorte de constrangimentos – morais, religiosos e legais – à conduta sexual. O sonho deles é a nossa realidade atual. Um pesadelo marcado pela animalização das relações humanas.
Revolução Sexual: teoria e prática
Herbert Marcuse, Wilhelm Reich, Norman O. Brown, Paul Goodman e outros intelectuais trabalharam incessantemente – nas esferas da educação e da cultura – para convencer o mundo ocidental de que a sexualidade sem entraves era o segredo da felicidade e que a repressão sexual, juntamente com a vida familiar, não eram nada além de patologias.
Eram sujeitos perdidos entre seus traumas de infância e teorias absurdas que não consideravam a natureza humana. Intelectuais tipicamente abstratos que acreditavam que se as relações sexuais pudessem ser libertadas das artificiais inibições sociais algo belo surgiria.
“A literatura e o senso comum comprovam que, ao longo do tempo, as relações sexuais entre homem e mulher sempre foram cheias de dificuldades, exatamente porque o homem não é apenas um ser biológico, mas um ser social consciente que carrega consigo uma cultura. Os intelectuais do século XX, todavia, buscaram libertar todas as relações sexuais de qualquer significado, de modo que dali em diante somente o puro desejo sexual contaria na tomada de decisão”.(“Nossa cultura…ou o que sobrou dela”)
A Revolução Sexual veio para pôr abaixo todos os tabus, convenções sociais, freios morais e inibições sociais que antes cercavam e limitavam a conduta sexual. A ideia era promover a total liberdade sexual entre homens e mulheres.
Como enfatiza Dalrymple, essas ideias foram adotadas “literal e indiscriminadamente” pela mais baixa e mais vulnerável das classes sociais. Não podemos negar os resultados: abusos, pedofilia, prostituição infantil, gravidez precoce e, sim, estupros cada vez mais brutais.
A banalização do sexo é a banalização dos relacionamentos, dos afetos, dos sentimentos morais, e tudo isso redunda na banalização das pessoas.
O estupro coletivo foi um crime terrível e que merece punição exemplar. Mas vejo nele também uma espécie de celebração macabra da sexualidade bestial, desenfreada e desinibida que transforma indivíduos conscientes em animais em busca do coito – que é precisamente a sexualidade com a qual os intelectuais da Revolução Sexual tanto sonhavam.
Sofremos ainda o grande risco de ter essa o legado macabro da Revolução Sexual sendo ensinado para crianças, desde cedo, nas escolas de educação infantil.
Um legado que vem disfarçado de boas intenções, camuflado como educação sexual, mas que é puro eco dos delírios de Reich e Marcuse a tentar “libertar” as crianças para a sexualidade “feliz” e selvagem já praticada por seus pais e irmãos mais velhos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário