Em vez de gastar tanto com escolas públicas e professores ausentes, é melhor transferir o dinheiro direto para os pais e deixá-los escolher a escola particular que preferem
O mais intrigante na ocupação das escolas em São Paulo não é o personalismo dos manifestantes e de seus apoiadores – que se alvoroçaram contra uma proposta de separação de estudantes por faixa etária, mas ficaram bem quietinhos quando Dilma cortou o orçamento do Fies, do Pronatec e do ProUni.
O pior é a crença cega em “escolas públicas de qualidade”. Eles estão há um século rezando e fazendo procissões para que a Escola Pública de Qualidade desça dos Céus à Terra. Há um século seus pedidos dão em nada. No entanto, como seguidores de uma seita fanática, não largam a fé.
Pois deveriam. Escolas públicas, para darem certo, exigem boas pessoas. Políticos, professores e diretores que pensem apenas no bem comum, e não nos seus próprios interesses.
Se uma política pública exige que as pessoas se comportem como santos, pode acreditar: não vai dar certo. As pessoas até são naturalmente benevolentes, mas não são madres-teresas em tempo integral. O desenho de uma política precisa se basear em pessoas reais, não em seres imaginários.
No sistema atual, o cidadão que recebe o serviço não pode deixar de pagar por ele ou procurar uma escola concorrente caso esteja insatisfeito. Os contribuintes são obrigados a pagar pelo serviço mesmo que não gostem dele ou não o utilizem.
Já os professores e diretores são remunerados por uma entidade distante – o Estado – e não pelos clientes diretos. Sabem que não terão prejuízo se faltarem dezenas de vezes por ano ou se os pais ficarem insatisfeitos. Não têm incentivo para inovar, cortar custos, pensar em produtos diferentes. Podem se dar ao luxo de fazer greves que duram um, dois, três meses. Se um aluno desistir de ir à escola, isso é até uma boa notícia para o diretor, que terá um problema a menos com que se preocupar.
E os políticos que coordenam o serviço não precisam melhorar o sistema – apenas fazer parecer, a cada quatro anos, durante a campanha eleitoral, que deram um jeito nas escolas. Ou falar banalidades na televisão que toquem o público mais que as banalidades dos candidatos concorrentes. É como se o síndico do prédio fosse encarregado da educação dos filhos dos moradores. Uma loucura.
Com incentivos assim, não dar certo é a regra. As notícias de jornal não deveriam tratar de escolas que decepcionaram, mas dos raros casos em que o desempenho é satisfatório. O mistério é descobrir por que algumas escolas públicas funcionam, e não o contrário.
Os manifestantes que ocuparam as escolas parecem acreditar que conseguirão convencer todos os políticos, professores e diretores a agir apenas pelo bem comum. Embriagados pelo protagonismo, gastam a voz em discursos morais sobre a importância da educação e da necessidade de “cada um fazer a sua parte”, e outros clichês.
Desculpem cortar o barato, mas já passou da hora de desistir de escola pública de qualidade. Se dependermos apenas de incentivos morais, e não de incentivos financeiros, não vai dar certo. Não adianta mudar os políticos. Não adianta gastar ainda mais em educação. É preciso mudar os incentivos.
Em vez de gastar tanto em escolas ineficientes e professores que mais faltam do que aparecem, é melhor transferir o dinheiro diretamente para a família de alunos pobres, em forma de vales, ou pelo menos passar as escolas para gestores privados.
Os pais (e não uma autoridade) decidem qual linha pedagógica preferem e qual escola escolherão para os filhos. As escolas passam a responder aos pais – e a concorrer entre si por estudantes.
Já é assim em muitos países. Nos Estados Unidos, as escolas charter (escolas tocadas por ONGs ou associações comunitárias e bancadas com dinheiro público) têm notas acima da média até mesmo quando estão em áreas pobres, que historicamente decepcionam nos índices de escolaridade. Há 180 escolas assim em Nova York; 6 mil nos Estados Unidos.
Um estudo da Universidade Stanford mostra que 53% dos alunos de escolas charter são pobres, contra 48% de escolas públicas; e 29% são negros, contra 16% em escolas públicas. Estudantes negros estudando em escolas charter leem, em média, 29 dias a mais por ano e estudam matemática 36 dias por ano a mais que estudantes de escolas públicas tradicionais.
Esse modelo não é novidade no Brasil. O governo de Goiás já está criando um sistema de escolas charter. O ProUni não é nada mais que privatização da educação: em vez queimar dinheiro em universidades públicas perdulárias que param em greve quase todo ano, melhor financiar bolsas de estudo em faculdades privadas.
Essas alternativas não são uma solução livre de falhas. É preciso evitar a “falácia do nirvana”, segundo a qual há uma solução perfeita para todos os problemas do mundo. No Chile, o sistema de voucher nem sempre incentiva a concorrência entre escolas, porque os pais muitas vezes preferem escolas mais próximas de casa que as melhores da cidade. E não se pode descartar a possibilidade de corrupção entre os políticos e os gestores privados.
Além disso, o sistema privado é diverso. Como hotéis ou marcas de biscoitos, há escolas e faculdades privadas excelentes e picaretas. As melhores universidades do mundo (Harvard, Oxford, Cambridge, Yale, Stanford) são entidades privadas que ganham uma boa dose de recursos públicos. Assim como uma penca de “uniesquinas” de baixa qualidade.
Mesmo assim, o sistema está está léguas à frente do padrão tradicional de escolas públicas. Como podem receber doações privadas, as escolas charter americanas se esforçam para manter a reputação e evitar reclamações. Algo que jamais passaria pela cabeça da maioria dos diretores de escolas públicas brasileiras.
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